Criado pelo Instituto
Riachuelo em parceria com Sebrae, Embrapa, Fundação Banco do Brasil, Emparn e
prefeituras do Seridó, o programa Agro-Sertão vem resgatando a cotonicultura
potiguar com uma nova abordagem: a produção 100% agroecológica, livre de agrotóxicos
e integrada à regeneração da caatinga. Em quatro anos de atuação, o projeto já
colheu mais de 165 toneladas de algodão em rama e recuperou 269 hectares de
vegetação nativa. O Instituto Riachuelo garante a compra integral da produção e
realiza o beneficiamento, assegurando renda, sustentabilidade e circularidade
ao processo produtivo.
O número de agricultores participantes cresceu de forma constante desde 2021, quando apenas 53 produtores de seis municípios acreditaram na proposta. Em 2025, o programa alcançou cerca de 180 agricultores em 15 cidades, apesar das dificuldades impostas pela escassez hídrica, que reduziu a safra do último ciclo.
Com investimentos de aproximadamente R$ 2 milhões em quatro anos, o Instituto
Riachuelo planeja expandir o Agro-Sertão e integrar 300 produtores até 2027,
consolidando a cadeia do algodão agroecológico como referência nacional.
O projeto Agro-Sertão completou quatro anos com resultados expressivos no Seridó potiguar. Primeiramente explica o que é o Agro-Sertão e que balanço o Instituto Riachuelo faz dessa trajetória até aqui?
O Agro-Sertão é um programa do Instituto Riachuelo, realizado em parceria com o
Sebrae, Embrapa, Fundação Banco do Brasil, EMPARN e prefeituras municipais. Até
a década de 1980, o algodão foi uma das principais fontes de economia do Rio
Grande do Norte. A iniciativa nasceu com o propósito de resgatar a
cotonicultura (cultivo de algodão), que, diferente do passado, o cultivo atual
é realizado de forma 100% agroecológica, sem uso de agrotóxicos e com total
respeito ao meio ambiente. Ao completar quatro anos de atuação, o Instituto
Riachuelo faz um balanço altamente positivo dessa trajetória: mais de 165
toneladas de algodão em rama foram colhidas e mais de 269 hectares da caatinga
foram regenerados por meio deste cultivo. Um dos marcos recentes foi o lançamento
da camiseta 100% algodão agroecológico, com tingimento natural e identificação
por QR Code utilizando tecnologia blockchain em parceria com a Blockforce,
empresa especializada em soluções digitais, que permite ao consumidor
acompanhar a rastreabilidade completa da cadeia produtiva. O Agro-Sertão
reforça o papel da Riachuelo como agente de transformação sustentável e de
impacto positivo no Rio Grande do Norte, promovendo desenvolvimento econômico
aliado à preservação ambiental e à valorização das pessoas.
Quantos produtores e municípios participam hoje do Agro-Sertão e como esses números evoluíram desde o início do projeto?
O Agro-Sertão teve início em 2021 com a participação de seis municípios e
53 agricultores familiares. O começo foi desafiador: muitos produtores estavam
desacreditados na retomada da cotonicultura, especialmente em um modelo sem o
uso de agrotóxicos, algo inédito na região. No entanto, a confiança foi sendo
reconstruída a cada safra. No segundo ciclo, o programa se expandiu para 11
municípios e 96 agricultores. Já no terceiro ciclo, o número chegou a 15
municípios e 143 produtores envolvidos. Em 2025, o projeto chegou a alcançar
aproximadamente 180 agricultores, representando um avanço expressivo desde a
sua criação. No entanto, a escassez hídrica registrada neste último ciclo
afetou cerca de 40% dos produtores, resultando no encerramento da safra com 100
agricultores ativos.
Um dos pilares do projeto é a produção agroecológica de algodão. Qual o diferencial dessa metodologia e como ela tem transformado a forma de produzir no semiárido?
A produção agroecológica de algodão é desenvolvida a partir da metodologia da
Embrapa conhecida como Unidade de Aprendizagem de Pesquisa Participativa (UAP).
Nesse modelo, o saber tradicional dos agricultores é integrado ao conhecimento
científico, valorizando práticas sustentáveis e fortalecendo a geração de renda
e a segurança alimentar das famílias do semiárido. Os encontros, realizados
quase todos os meses, são momentos de diálogo e troca de experiências, nos
quais surgem soluções adaptadas à realidade local. Nas UAPs, os agricultores
aprendem, por exemplo, o preparo do solo, a importância de plantar no rastro da
chuva, a curva de nível, aproveitando melhor a umidade do solo, e o uso do
biofertilizante — um fertilizante líquido obtido pela fermentação de resíduos
naturais que fornece nutrientes essenciais às plantas, atua como defensivo
natural contra pragas e doenças e melhora a saúde do solo. A metodologia também
estimula o plantio consorciado, que integra o algodão a culturas alimentares,
garantindo diversificação produtiva, equilíbrio ecológico e mais segurança para
as famílias agricultoras.
Nesse sistema o Instituto Riachuelo garante a compra de 100% da produção do agricultor? Também há investimento no beneficiamento local do algodão?
No programa Agro-Sertão, o Instituto Riachuelo garante a compra de 100% da
produção dos agricultores participantes, assegurando não apenas a
comercialização, mas também o valor agregado do produto final. A compra é feita
na forma de pluma, resultado do beneficiamento do algodão em rama — composto
por pluma e caroço — realizado na unidade de beneficiamento localizada em
Cruzeta (RN). Nesse processo, a pluma segue para a cadeia têxtil, enquanto o
caroço retorna ao agricultor, cumprindo um papel essencial dentro do sistema
produtivo. Parte dele é utilizada para o replantio, após o processo de
flambagem (retirada do línter), e o restante serve como alimento para o
rebanho, sendo uma fonte natural e altamente proteica. A iniciativa tem sido
fundamental para reerguer a cadeia produtiva do algodão no Rio Grande do Norte,
combinando inovação, sustentabilidade e inclusão produtiva. Ao resgatar a
cultura algodoeira, o Agro-Sertão fortalece a economia local, regenera a
caatinga e promove renda e segurança alimentar às famílias agricultoras, que
passam a integrar um modelo de produção agroecológico e circular, onde nada se
perde e tudo se transforma.
O Agro-Sertão é resultado de uma rede de parcerias. Como essa integração tem sido fundamental para o sucesso e a expansão do projeto?
O sucesso do Agro-Sertão é resultado direto da força dos grandes parceiros
e da credibilidade de seu verdadeiro protagonista: o agricultor. É ele quem
abre as portas de sua propriedade para que cada instituição envolvida cumpra,
com maestria, o papel que lhe cabe. Logo no primeiro encontro com os
agricultores, é reforçada a responsabilidade de cada instituição. O Instituto
Riachuelo, fomentador do programa, garante 100% da comercialização da safra de
algodão agroecológico, assegurando uma precificação justa negociada entre os
agricultores e a fiação compradora. Já a Embrapa contribui com seu conhecimento
técnico, capacitando agricultores e técnicos em tecnologias inovadoras de
produção do algodão e de sistemas consorciados agroalimentares. Essas
orientações são replicadas nas propriedades pelos consultores do Sebrae-RN, que
realizam visitas quinzenais aos novos participantes e mensais aos produtores
mais experientes. Esse acompanhamento técnico contínuo tem sido decisivo para
consolidar as boas práticas agroecológicas. A Fundação Banco do Brasil
tornou-se uma aliada estratégica do programa, ao viabilizar a aquisição de
máquinas poupadoras de mão de obra, que aumentaram a eficiência e a
produtividade no campo. A Emparn também tem papel essencial, cedendo o espaço
da unidade de beneficiamento e doando palmas forrageiras, fundamentais para o
fortalecimento da alimentação dos rebanhos e a sustentabilidade das
propriedades.
As prefeituras dos 15 municípios parceiros — Acari, Bodó, Caicó, Carnaúba dos
Dantas, Cerro Corá, Cruzeta, Currais Novos, Florânia, Ipueira, Lagoa Nova,
Santana do Seridó, São João do Sabugi, São José do Seridó, São Vicente e
Tenente Laurentino Cruz — completam essa rede, oferecendo apoio logístico e
institucional. Essa integração de saberes, esforços e compromissos é o que tem
permitido ao Agro- Sertão se expandir e consolidar-se como um modelo de
desenvolvimento sustentável no semiárido potiguar.
Como se dá a integração desse projeto com o Pró-Sertão?
Além da produção agroecológica de algodão, o Instituto Riachuelo também
expandiu sua atuação na região com o projeto Pró-Sertão, que promove o
fortalecimento da cadeia da moda com oficinas de costura, o bordado
impulsionando o trabalho artesanal têxtil potiguar, fomentando a preservação
deste importante patrimônio cultural da região.
Além dos resultados produtivos, há um impacto social importante nas comunidades atendidas. Que mudanças mais chamam sua atenção na vida das famílias envolvidas?
Mais do que os resultados produtivos, o que mais chama atenção é o impacto
social que o projeto tem gerado nas comunidades atendidas. O amor dos
agricultores por essa cultura é algo comovente, sempre há alguém que relembra
as histórias do avô ou do pai que plantava algodão e como a época da colheita
era um momento de alegria, união e celebração familiar. No início, eu imaginava
o projeto muito voltado aos resultados ambientais e econômicos, mas logo ficou
evidente a força do impacto social. Muitos produtores, apesar de serem vizinhos
há anos, nunca haviam trocado experiências ou se ajudado mutuamente. Hoje, além
de se reunirem nas UAPs, eles conversam sobre práticas sustentáveis e se apoiam
no dia a dia do campo. Outro aspecto marcante é a presença feminina. Cada vez
mais mulheres participam ativamente das atividades, mostrando a força e o
protagonismo da mulher na agricultura do semiárido.
Recentemente, o algodão cultivado pelos agricultores do Agro-Sertão ganhou espaço na coleção da Riachuelo. O que representa, na prática, ver o produto do sertão chegar às lojas e vestir consumidores em todo o país?
Ver o algodão do Agro-Sertão chegar às lojas da Riachuelo é a concretização
de um sonho coletivo, mostrando que moda e sustentabilidade podem caminhar
juntas rumo a um impacto positivo social e ambiental. Recentemente, alguns
agricultores participaram de uma visita à fábrica para acompanhar de perto todo
o processo: do algodão plantado por eles, ao fio, depois da malha ao tingimento
natural, até a confecção da camiseta. O momento em que viram o produto final
nas prateleiras da loja Riachuelo foi de pura emoção, um momento indescritível.
A peça feita com 100% de algodão agroecológico e tingida com corantes naturais
representa um marco na moda sustentável brasileira. Além da matéria-prima
responsável, o lançamento se destaca pela rastreabilidade completa da cadeia
produtiva, que vai do plantio à loja, utilizando tecnologia blockchain. Em
parceria com a Blockforce, empresa especializada em soluções digitais para uma
moda mais transparente, cada camiseta conta com um QR code que permite ao
consumidor acessar todas as etapas de sua produção, reforçando a autenticidade
e a confiança na origem de cada peça.
Quanto o Instituto Riachuelo já investiu, direta ou indiretamente, nas ações do Agro-Sertão — e quais são as metas para os próximos ciclos?
O Instituto Riachuelo já investiu, ao longo dos últimos quatro anos, cerca
de R$ 2 milhões no programa Agro-Sertão, contemplando ações de capacitação,
aquisição da máquina de beneficiamento e fortalecimento do beneficiamento
local. A meta para os próximos ciclos é expandir de forma estruturada,
ampliando o número de agricultores participantes e consolidando a cadeia
produtiva no semiárido. Até 2027, a expectativa é alcançar 300 produtores
integrados ao programa.
Quem
Renata Fonseca é engenheira
têxtil e atua no Instituto Riachuelo desde sua criação, em 2021. Atualmente,
ocupa o cargo de gerente da instituição, onde lidera iniciativas voltadas ao
desenvolvimento social, econômico e ambiental. Entre os programas sob sua
gestão estão o Pró-Sertão, o Agro-Sertão, o projeto de tingimento natural
produzido no Cariri paraibano, o de Bordados e as ações de educação voltadas
aos filhos de colaboradores.
Tribuna do Norte
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