Maior parte das crianças chega
sem acompanhamento | Foto: Arquivo TN
Dados do Conselho Tutelar
mostram que a fila de espera por atendimento neuropediátrico em Natal supera
4,5 mil crianças. Segundo o Conselho Tutelar, uma parcela dessas crianças está
em situação de vulnerabilidade e chega ao órgão sem diagnóstico, sem acompanhamento
psicológico e, muitas vezes, em crise.
A maior parte das crianças e
adolescentes com transtornos psicológicos chega às unidades de atendimento sem
nenhum acompanhamento. Ao serem encaminhadas para tratamento, a fila de espera
pode durar meses. “Quando demora, pedimos à mãe que traga essa regulação ao
Conselho Tutelar, e nós requisitamos ao órgão de saúde para que ele dê o mais
breve possível uma contrarreferência, porque a criança não pode esperar”,
destaca William Cabral, conselheiro tutelar da Zona Leste de Natal.
Segundo o Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA), é direito de toda criança e adolescente receber
proteção integral, incluindo os cuidados necessários ao seu desenvolvimento
físico e mental. Na ponta desse sistema está o Conselho Tutelar, responsável
por orientar famílias, requisitar serviços essenciais e adotar medidas
protetivas quando os direitos são ameaçados.
A partir do recebimento, o
Conselho notifica ou atende a família e avalia a necessidade de aconselhamento,
requisição de serviços ou encaminhamento a órgãos de segurança e saúde.
Grande parte dos casos chega
por meio de relatórios escolares e unidades de saúde. Há situações em que a
família interrompe a medicação no horário escolar, o que agrava crises de
comportamento. “Às vezes, a mãe deixa de dar a medicação da criança no horário
em que a criança está na escola, para dar quando a criança está em casa, porque
assim ela fica tranquila em casa”, relata o conselheiro.
No Conselho Tutelar, cada caso
passa por uma triagem inicial da equipe de referência que avalia sinais de
autismo, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno opositor desafiador (TOD)
e outros indicadores clínicos.
Segundo William Cabral, a
ausência de tratamento rápido pode resultar em quadros graves de automutilação,
tentativas de suicídio, crises agressivas, além de rupturas familiares e
escolares.
Ele explica que a população
deve ficar atenta às crianças e adolescentes com irritabilidade intensa,
explosões emocionais e desregulação severa: “Enquanto nós não tivermos essa
vontade de fazer alguma coisa por causa das crianças, a sociedade como um todo
vai pagar o preço.”
A Secretaria Municipal de
Saúde informou que deu início a um novo serviço de Avaliação Global para
crianças com suspeita de autismo e, com isso, espera diminuir a fila. A
proposta é que a equipe multidisciplinar seja formada por psicólogos,
fonoaudiólogos, aplicadores de ABA, psicopedagogos, nutricionistas e
neuropsicólogos, além do suporte de um neuropediatra.
Atraso no cuidado agrava
quadros mentais
A ausência de tratamento
adequado e rápido pode gerar impactos profundos e duradouros no desenvolvimento
infantil. “São muitos impactos, inclusive o desenvolvimento precoce de
transtornos mentais”, explica a psicóloga do Conselho Tutelar, Sayonara Freitas.
O acompanhamento desde cedo
ajuda a prevenir agravamentos, melhora a adaptação escolar e reduz danos na
socialização.
Quando o suporte não existe, a
tendência é de retraimento, dificuldades de convivência e maior vulnerabilidade
a influências externas. “Quando os pais oferecem as mídias, essas mídias captam
eles, principalmente a questão dos jogos eletrônicos e das redes sociais. E aí,
é uma situação bem complexa.”
Os primeiros sinais de que uma
criança ou adolescente pode estar enfrentando um transtorno mental costumam
surgir antes mesmo de qualquer diagnóstico formal.
Segundo Sayonara Freitas,
mudanças bruscas de comportamento, alterações de sono e apetite, agressividade
ou retraimento excessivo são algumas das expressões mais comuns desses
transtornos. “Às vezes, até a timidez não é timidez, pode ser depressão infantil”,
explica.
Na primeira infância, esses
sinais muitas vezes aparecem no brincar, já que crianças pequenas não conseguem
verbalizar emoções com clareza. “Nem todo adulto consegue entender”, ressalta a
psicóloga. Nesse contexto, a procura por profissionais se torna ainda mais
necessária.
Em Natal, crianças e
adolescentes até 14 anos, 11 meses e 29 dias são atendidos pelo Hospital Maria
Luiza Fernandes e pelo Hospital Araken. A partir dos 15 anos, o atendimento
ocorre no Hospital Geral Dr. João Machado.
“Quando uma criança ou
adolescente tem uma situação de crise psíquica, ou então uma crise de ansiedade
muito forte, deve-se procurar atendimento em todas essas situações”, reforça a
psicóloga.
Tribuna do Norte