As recomendações são das mais
diversas, desde a capacitação de servidores, uso de câmeras corporais em
policiais penais, implementação do sistema estadual de prevenção e combate à
tortura, programas de trabalho e escolarização prisional, aumento de efetivo,
campanhas junto a empresários para contratação de egressos, melhorias em
processos licitatórios, entre outros. O estudo foi enviado ao Estado, que vai
lançar nesta quinta-feira (07) um plano estadual para aplicar o Pena Justa. É
possível que o estudo incorpore sugestões do desembargador.
“Não tem isso de cumprir ou não cumprir. É uma decisão do Supremo. Temos uma
oportunidade ímpar para reverter esse quadro. Não vai se eliminar todas essas
mazelas, mas é sair dessa situação de inconstitucionalidade”, explica Walter
Nunes.
Para adotar essas medidas e efetivamente implementá-las no RN, o caminho
exigirá uma série de ações, algumas não tão rápidas, como a abertura de vagas
no sistema penal, aumento de efetivo da polícia penal e a criação de um sistema
de regulação de vagas nas unidades prisionais (semelhante ao dos hospitais no
SUS). Outra dessas medidas é o desencarceramento de presos, que poderão cumprir
as penas com medidas alternativas, como tornozeleiras eletrônicas, por exemplo.
O RN trabalha na elaboração do seu plano, que precisará passar pelo crivo do
Supremo Tribunal Federal (STF).
O estudo conduzido por Walter Nunes envolveu o Departamento de Direito
Processual e Propedêutica da UFRN e aponta ainda os gargalos históricos
estruturais e de déficit de pessoal e assistência ao preso no RN, como falta de
camas para presos, garantia da oferta de trabalho e educação para os apenados
além da execução completa de recursos nos orçamentos previstos por ano. A TN
noticiou, em maio, uma ação do Ministério Público que apontava
contingenciamento de R$ 480 milhões no sistema penal potiguar nos últimos anos.
Entre as reflexões, Nunes aponta que a maior parte dos presos no RN, assim como
no Brasil, estão presas por crimes sem violência ou grave ameaça do que por
crimes violentos. No RN, o estudo utilizou dados de abril de 2024 que apontam
que o RN tinha 7.069 pessoas privadas de liberdade em estabelecimentos penais
do Estado, sendo 513 delas presas em cárcere por crimes violentos.
O desencarceramento, uma das medidas previstas no Pena Justa, não será nem deve
ser de maneira desenfreada, segundo Nunes. A medida visa um uso racional das
vagas nas prisões brasileiras e deverá ser mediante uma avaliação sistêmica da
Secretaria de Estado da Administração Penitenciária e do Judiciário.
“Não é colocar as pessoas na rua. O desencarceramento é para quem não deveria
ter entrado ou um dia fez jus a quem ingressasse mas hoje não justifica mais o
cara ficar na prisão. Não vai se tirar porque tem que tirar. É tirar porque
partiu disso: prende-se muito e prende-se mal. Não será algo irresponsável:
‘não há lugar para todos, então vamos tirar’. Não é isso. O problema é que
várias das pessoas que lá estão não deveriam estar”, comenta. “Deve soltar quem
deve ser solto. Isso é um trabalho que há de ser feito junto ao Judiciário, MP,
advocacia, cada um com seu papel”, cita.
“A centralidade do plano é conseguir construir uma política penal que além de
punir, garanta que você vai de fato levar as pessoas de volta ressocializadas e
reduzir os índices de encarceramento, qualificando a prisão. É prender as
pessoas considerando a necessidade delas permanecerem presas. Não adianta
prender por prender. Se você faz isso, lota-se as cadeias e aumenta-se o número
da criminalidade”, acrescenta a secretária adjunta de Administração
Penitenciária (Seap), Armélie Marques Brennand. “O processo de
desencarceramento só pode ser feito dentro da legalidade. Ele pode ir para rua?
Atende os requisitos da Lei de Execuções Penais? Ter cumprido parte da pena,
bom comportamento”, exemplifica.
Desembargador: Ampliação de
efetivo é fundamental
Em relação à gestão dos recursos e a parte de assistência ao preso, o
desembargador Walter Nunes comenta que a ampliação de efetivo da Polícia Penal
é primordial para os avanços das políticas públicas. Além disso, profissionais
como psicólogos, assistentes sociais, educadores, entre outros, também
precisarão entrar no rol de funções a serem incorporadas nas unidades penais
potiguares.
“Não temos capacidade de utilizar os recursos financeiros disponibilizados. A
estrutura organizacional de servidores da Seap é diminuta. Não se tem um
engenheiro. Como essa pessoa vai fazer um projeto para reforma de uma
unidade?”, comenta Walter Nunes. “Nós trabalhamos a assistência social como se
fosse uma atividade meio da execução penal, ora, é uma atividade fim. Se a
finalidade da pena é recuperar, precisamos ter profissionais capacitados e
adequados com especialização em lidar com pessoas recolhidas em unidades
prisionais. Precisa-se de psicólogo, médico específico para os quadros da Seap.
É assim que ocorre no presídio federal. Estamos sugerindo isso”, complementa
Walter Nunes. “Nesse aspecto o RN é extremamente precário”, finaliza.
Tribuna do Norte

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