Apesar do avanço, a falta de
informação e a persistência de mitos sobre o processo de doação, especialmente
entre os mais jovens, ainda são desafios. “É preciso mais consciência por parte
dos jovens. Quando a idade mínima para doação foi reduzida, começamos a ter
cadastros de pessoas com mais de 40 e 50 anos, que geralmente já têm mais
maturidade. Hoje, muitos demoram a amadurecer, a entender que um dia pode
acontecer na própria família”, alerta Roseli Cortez, presidente da Associação
de Humanização e Apoio ao Transplantado de Medula do Rio Grande do Norte
(HATMO-RN). A entidade sem fins lucrativos atua, desde 2008, no suporte a
pacientes e na promoção da doação de medula.
Roseli relembra que pessoas
que fazem tatuagens e procedimentos estéticos, não podem doar sangue e nem
medula por um período, que costuma ser de até um ano após o procedimento. “Os
jovens estão preocupados com beleza e estética e esquecem do próximo. Quando
atingem a maturidade, já passaram da idade para doar. Por isso, precisamos
fazer um trabalho de conscientização desde cedo, nas escolas, com as famílias”,
afirma.
Ela destaca que o RN avançou
nos últimos anos, dispondo atualmente de mais centros especializados em
transplantes, como no Hospital Rio Grande e na Liga Contra o Câncer. “Temos
condições de fazer um trabalho maravilhoso nessa parte de conscientização. O paciente
não precisa mais sair do estado para transplantar. A maioria realiza aqui
mesmo, em Natal”, pontuou.
Segundo diz, há um aumento no
número de operações devido o transplante haploidêntico, no qual o doador não
precisa ser 100% compatível. “Mas há famílias que não atingem nem o grau de
compatibilidade exigido. Em muitos casos, os irmãos são poucos ou inexistentes,
os pais têm diabetes ou outras comorbidades e não podem doar. Por isso, é
fundamental manter a divulgação da importância de doar medula”, acrescentou
Cortez.
A medula óssea, conhecida
popularmente como “fábrica do sangue”, é um tecido hematopoiético responsável
pela produção das células sanguíneas (hemácias, leucócitos e plaquetas). O
processo de doação começa com uma triagem para avaliação da compatibilidade
entre doador e receptor. Após essa etapa e o estímulo à produção das
células-tronco hematopoiéticas, a coleta pode ser feita por aférese (via acesso
venoso) ou por punção e aspiração na crista ilíaca (bacia).
Segundo a hematologista Ana
Emília Freitas, do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL-UFRN-Ebserh),
alterações no hemograma, como pancitopenia (redução de hemácias, leucócitos e
plaquetas), fadiga intensa associada à febre, manchas no corpo ou sangramentos,
são sinais de alerta que podem indicar problemas na medula óssea e devem ser
investigados.
Para se tornar doador, basta
procurar o hemocentro da cidade ou estado. No RN, o cadastro é feito no
Hemonorte, e o doador é inserido no REDOME.
Após o cadastro, o doador é
convocado para entrevista e realização de exames mais detalhados, dando início
ao processo de doação. “Inicialmente, realiza-se a estimulação da medula óssea
para aumentar a produção de células-tronco. Depois, a coleta é feita via
aférese, ou por punção na crista ilíaca. A recuperação, em geral, é rápida e
sem riscos à saúde do doador”, esclarece Ana.
Ela destaca que o Brasil
possui o terceiro maior registro de doadores de medula óssea do mundo, mas
encontrar um doador compatível ainda é um grande desafio, sobretudo diante do
crescente número de pacientes necessitando de transplante, demanda que o ritmo
atual de cadastros não acompanha. Por isso, a especialista reforça a
importância da conscientização e do engajamento da população.
Bernardo mobiliza redes por um
transplante
Bernardo, de 14 anos, foi
diagnosticado com leucemia em 2023. Após um período de estabilidade, a doença
se agravou em 2025, tornando necessário o transplante de medula óssea. A busca
por um doador compatível mobilizou milhares de pessoas após a divulgação de sua
história nas redes sociais. “Muitas pessoas abraçaram a nossa causa, não só
familiares e amigos, mas também desconhecidos que se sensibilizaram com a
situação de um menino tão jovem”, relata Monalisa Oliveira, mãe de Bernardo.
Monalisa ressalta que a doação
é um ato simples, mas que pode salvar vidas como a do filho. Ela destaca que,
quanto mais pessoas cadastradas no REDOME, maiores são as chances de encontrar
um doador compatível. “A compatibilidade é, em média, uma em 100 mil. Quanto
mais pessoas cadastradas, maiores são as chances para quem está na fila de
espera. Queremos deixar essa mensagem: com um simples gesto, é possível salvar
vidas”, afirma.
Ao receber o diagnóstico,
Bernardo inicialmente não compreendeu a gravidade da situação, mas com o apoio
dos pais, Leonardo e Monalisa, passou a entender melhor o que viria pela
frente. Mesmo diante das incertezas, ele mantém o otimismo e incentiva outras
pessoas a se tornarem doadoras. “Fico feliz em saber que tem gente torcendo por
mim, indo se cadastrar. É bom receber esse apoio e saber que isso é muito
importante. A doação de medula óssea pode salvar uma vida. Pense que um
familiar seu poderia estar nesse lugar”, enfatizou.
“Sou prova de que a doação
funciona”
“É um gesto simples, mas com
um impacto enorme”, diz Rogéria da Silva, moradora de São Bento do Trairi, no
interior do Rio Grande do Norte. Diagnosticada com leucemia mieloide, ela teve
a vida transformada após um transplante de medula óssea com um doador fora do
núcleo familiar. Antes do procedimento, Rogéria admite que sentiu medo diante
da doença e da incerteza quanto à compatibilidade. “No início, veio o medo, a
dúvida de como seria encontrar um doador. Meu irmão era 50% compatível, mas
infelizmente não pôde doar. Felizmente, encontrei um doador 100% compatível no
REDOME. O tratamento foi difícil, teve muitas etapas, mas quando chegou o dia,
foi a melhor sensação do mundo”, relatou.
Hoje, com o transplante
realizado, Rogéria tem uma nova perspectiva de futuro e sonha em conhecer a
pessoa que lhe “deu a vida novamente”. “A doação de medula óssea é um ato de
amor e generosidade que transforma vidas. Ao se registrar como doador, você está
dando esperança e uma segunda chance a alguém que precisa. É um processo
simples, seguro e pode fazer toda a diferença”, finaliza.
Cadastramento terá Dia D
Para conscientizar sobre a
importância da doação de medula óssea, o Hemocentro do Rio Grande do Norte
(Hemonorte) lançará nesta segunda-feira (12), a campanha “A vida deve ser
compartilhada” e no próximo sábado (17), das 13h às 17h, ocorrerá o Dia D para
o cadastro de medula dentro das ações da campanha.
Em 2024, o RN realizou 165
transplantes de medula, 58 a mais do que em 2023. Contudo, ainda há 53 pessoas
na fila aguardando um doador compatível. Para ser doador, precisa ter entre 18
e 34 anos e meio, não apresentar histórico pessoal de doenças oncológicas,
apresentar um documento de identidade e telefones para contato. Pessoas já
cadastradas devem ficar atentas para o caso de serem convocadas.
Se houver mudança de endereço
ou de contato, o Hemonorte reforça a importância de atualizar os dados no site
e no aplicativo do REDOME.
Tribuna do Norte

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