quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Câmara derruba MP do IOF e impõe derrota a Lula e Haddad

A Câmara derrubou na quarta-feira (8) a MP (Medida Provisória) do IOF (1.303 de 2025) e impôs importante derrota ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O governo deixará de arrecadar R$ 31,4 bilhões em 2025 e em 2026 com a derrubada da MP e terá de lidar com um rombo orçamentário até o fim do mandato, em 2026.

Os deputados aprovaram por 251 votos a favor e 193 votos para retirar a MP da pauta do plenário. Dessa forma, o mérito da medida não chegou a ser analisado. Como a medida perdia a validade à meia-noite da quarta-feira (8), não teria como ser analisada em outra sessão. Ainda precisaria passar pelo Senado.

A MP dava ao governo Lula R$ 10,55 bilhões em 2025 e R$ 20,89 bilhões em 2026, ano eleitoral. Zarattini criticou o descumprimento de acordo firmado na terça-feira (7) na Residência Oficial do presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB).

A comissão especial havia aprovado a MP por placar apertado: de 13 votos a favor e 12 contra. Os deputados governistas tentaram salvar partes da MP e desidrataram as medidas arrecadatórias. Sem sucesso.

A equipe econômica terá agora que recalcular as projeções de receitas no Orçamento para 2025, com possibilidade de aumentar o congelamento dos gastos para compensar a frustração de arrecadação.

Zarattini declarou que o governo Lula poderá publicar decretos ou portarias para aumentar outros tributos, como o próprio IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

Saga do IOF

Com a possibilidade de descumprimento da meta fiscal de 2025, que é de um deficit zero –com tolerância de até 0,25% de saldo negativo–, o governo congelou R$ 31 bilhões em gastos em maio e aumentou alíquotas do IOF.

Empresários e congressistas tiveram uma reação negativa. A Câmara e o Senado derrubaram o decreto que aumentava as alíquotas. O governo reagiu e procurou o STF (Supremo Tribunal Federal), alegando que o IOF é um tributo regulatório federal.

O ministro da Corte Alexandre de Moraes permitiu a volta das alíquotas definidas pelo governo, com exceção do risco sacado.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teria feito um acordo com congressistas para diminuir as alíquotas do IOF e lançar uma MP (Medida Provisória) para compensar as perdas de arrecadação, conhecida como MP do IOF. Apesar de ser conhecida por este nome, o texto não previa mudanças nas alíquotas do tributo federal.

A Receita Federal mostrou que, mesmo com as alíquotas mais baixas do que o definido anteriormente, o IOF rendeu R$ 51,9 bilhões ao governo Lula de janeiro a agosto, o maior patamar para o período na série histórica, iniciada em 1995. Em 2024, quando as alíquotas eram menores, a receita com o tributo superou R$ 70 bilhões, o maior valor anual da série histórica.

Governo federal tentou várias estratégias

O governo Lula (PT) já admitiu derrota na votação da MP (medida provisória) alternativa ao IOF de aumento de impostos no Congresso e adota o discurso de que a derrubada da proposta pelos parlamentares vai levar a corte de gastos e de programas sociais, na tentativa de ganhar a opinião pública apesar do revés no Legislativo.

A ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) argumentou que a medida traz justiça tributária, mote que o governo tem usado para mobilizar sua base nas redes e que serviu para pressionar pelo aumento da isenção do Imposto de Renda, aprovado na Câmara na semana passada.

A avaliação no Palácio do Planalto é a de que a disputa não está mais em torno de possíveis mudanças no texto para angariar votos de setores contrários. Para líderes governistas, o embate no plenário é uma antecipação da corrida eleitoral de 2026, com partidos do centrão e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) operando para que Lula perca uma importante medida de arrecadação no ano eleitoral.

Além de Tarcísio, os presidentes do PP, senador Ciro Nogueira (PI), e do União Brasil, Antonio Rueda, são mencionados como artífices da eventual rejeição do texto.

O governador paulista negou que estivesse convencendo deputados a votarem contra a medida, como afirmam os deputados petistas.

A previsão original do governo com a MP era de arrecadar quase R$ 35 bilhões entre 2026 e 2027, sendo pouco mais de R$ 20 bilhões em 2026, ano eleitoral. Após as mudanças feitas por Zarattini, a nova previsão era de R$ 17 bilhões para o ano que vem.

A MP precisava ser aprovada na Câmara e no Senado ainda na quarta-feira (8) para que não perdesse a validade, cenário considerado improvável por opositores e governistas. Na terça-feira (7), a MP foi aprovada com apenas um voto de diferença na comissão mista.

A orientação do presidente Lula foi para que o texto fosse levado ao plenário para que a oposição seja obrigada a registrar voto contrário, o que seria usado pelo governo para desgastar os detratores.

“Essa medida tributa muito o sistema financeiro, eu diria o andar de cima da sociedade: quem ganha mais. E quem ganha mais tem que contribuir mais para financiar os programas sociais, mas também para fazer justiça tributária”, afirmou Gleisi.

“Sei que tem setores na sociedade brasileira, no Congresso Nacional, se movimentando contra essa medida porque dizem que essa medida pode […] ajudar o presidente Lula. Essas pessoas, na realidade, estão trabalhando contra o Brasil, estão trabalhando contra o povo brasileiro, que precisa de medidas como essa tanto para fazer a justiça tributária como para ter financiamento de programas e políticas públicas importantes”, completou a ministra.

Aliados do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, admitiram que ele vem pedindo votos contra a medida provisória do governo que aumenta a impostos sobre aplicações financeiras. A proposta prevê a uniformização na cobrança de Imposto de Renda sobre os ganhos com os investimentos em 18%. A MP poderia render até R$ 17 bilhões ao governo em 2026, além evitar gastos a uma expectativa de R$ 10 bilhões. Tarcísio estaria pedindo para os partidos de centro se posicionarem contra a medida provisória, em uma tentativa de enfraquecer o governo e projetar a direita para as eleições presidenciais do ano que vem.

Revés fará o governo refazer orçamento

O governo Lula apostava na medida provisória para arrecadar R$ 20,9 bilhões a mais em 2026, ano eleitoral. O recurso já foi incluído no projeto de Orçamento do ano que vem, que agora precisará ser reformulado. O Executivo também planejou uma economia de despesas de aproximadamente R$ 15 bilhões com mudanças incluídas na MP, podendo gerar um buraco de até R$ 35 no no Orçamento do ano que vem.

A derrota vai obrigar o governo a cortar mais gastos ou congelar despesas para cumprir as regras fiscais. Em grande medida, a arrecadação da MP geraria receitas que não ficam engessadas no Orçamento e que podem ser usadas livremente, sendo colocadas em diferentes políticas públicas. É dessa cesta que sai o dinheiro para pagar o Bolsa Família, o Auxílio Gás, o Pé-de-Meia e as emendas parlamentares, frontalmente atingidos.

Pouco antes do início da apreciação do texto na Câmara, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já admitia a possibilidade de derrota: “Se ela (a MP)não for aprovada, vamos ver como é que nós vamos fazer”, disse o presidente. “Se o Congresso não quiser votar, estará contra interesses do povo, e não contra Lula.”

Ele classificou como “bobagem” e “pobreza de espírito” encarar a votação como uma antecipação da corrida eleitoral de 2026. “Se alguém quer misturar isso com eleição, eu sinceramente só posso dizer que é uma pobreza de espírito extraordinária. Qualquer um pode dizer que a proposta é dele. Qualquer deputado pode se vangloriar que foi ele que votou favorável”, disse.

Como mostrou o Estadão, deputados receberam nos últimos dois dias telefonemas de Lula e do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas em uma disputa nos bastidores pela MP. Na terça-feira, 7, primeiro duelo em torno da medida, a provação da proposta na comissão especial do Congresso por apenas um voto deu o tom do tamanho da dificuldade que o governo teria.

Também pouco antes do início da votação, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que as alternativas seriam avaliadas depois do resultado. “Se tivermos um resultado adverso, eu volto à mesa do presidente, é ele que decide os rumos do País. A gente sempre apresenta um cardápio de soluções.”

A MP poderia ampliar a arrecadação do governo no ano que vem, em pleno ano eleitoral, em cerca de R$ 17 bilhões. A equipe econômica defende que o esforço era necessário para fechar as contas do governo e cumprir a meta de superávit fiscal. A oposição, por sua vez, sustentou que o Executivo desejava arrecadar mais para bancar programas sociais e alavancar a imagem de Lula às vésperas da eleição.

Tribuna do Norte

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