Paulo e Luiza saíram do RN em busca de oportunidades na Europa - Fotos: Cedidas
Pelo segundo ano, as cozinhas
do Algarve, no sul de Portugal, recebem o gastrólogo potiguar Paulo Costa, de
35 anos. É por lá que ele aprende novas receitas e mantém contato com outros
cozinheiros de diversas partes do mundo. Natural de Assú, no Oeste do Estado,
Costa foi um dos selecionados do programa de intercâmbio internacional
promovido pelo Senac-RN em parceria com o resort Pine Cliffs, uma das
principais redes hoteleiras do País. Em quatro anos, o Senac-RN já “exportou”
50 profissionais para a Terrinha.
Mais do que abrir fronteiras,
a iniciativa tem multiplicado conhecimento e fortalecido o mercado local, diz o
presidente do Sistema Fecomércio-RN, Marcelo Queiroz. De volta ao Estado,
muitos participantes passam a atuar como instrutores, empreendedores e mentores
de novos alunos. Assim, o ciclo recomeça. “O intercâmbio de experiências que
firmamos tem efeitos concretos e mensuráveis: possibilitamos a inserção de
dezenas de egressos em redes hoteleiras”.
Entre novos temperos e
idiomas, Paulo aprendeu que um dos maiores desafios da jornada longe de casa
não é puramente técnico, mas a convivência. “A gente precisa ter cabeça boa,
coração bom e mente aberta para lidar com as dificuldades porque o que é positivo
a gente absorve naturalmente. Hoje posso dizer que precisei reaprender várias
coisas porque é um mundo completamente diferente”, diz.
Paulo é natural de Assú – Foto:
Reprodução
Paulo é cozinheiro há 17 anos
e atua como instrutor do Senac de forma eventual. Em 2022, decidiu tentar o
processo seletivo do programa de empregabilidade internacional do Senac. “Estou
terminando agora no começo desse mês a minha segunda passagem por Portugal. Foi
uma realização. Pedi para participar do programa como se fosse aluno ou
ex-aluno, e deu certo. Passei nas entrevistas e já é o segundo ano que venho
pra cá”, conta Paulo, que retorna ao Brasil nesta semana após seis meses fora.
Com experiência na área de
bufê, a vivência em Portugal também transformou a maneira como ele enxerga a
própria cozinha. Convivendo com profissionais de diversas nacionalidades, Paulo
passou a valorizar ainda mais a disciplina, o respeito aos ingredientes e o
cuidado com a apresentação dos pratos. “Aprendi muito sobre a forma de trabalho
europeia. Eles têm outra relação com o tempo e com os processos.
A adaptação, segundo ele, é
uma aula diária. O potiguar divide a cozinha com colegas de 28 nacionalidades
diferentes e enfrenta ritmos intensos de trabalho. “Aprendi receitas novas,
formas diferentes de trabalhar ingredientes e o comportamento no ambiente de
cozinha. No hotel onde atuo, há cerca de 28 nacionalidades, é um choque
cultural enorme”, conta.
Nem tudo, porém, é simples.
Paulo conta que já vivenciou episódios de preconceito e que a experiência da
primeira vez fez com que ele encarasse o problema de maneira diferente. Apesar
disso, ele avalia que o intercâmbio foi uma virada na sua trajetória. “Infelizmente,
há episódios de xenofobia. Por ser imigrante e brasileiro, a gente enfrenta
preconceito. No meu primeiro ano, por exemplo, o chef dizia que eu não sabia
nem fazer arroz. Mas eles fazem tudo de forma diferente. Se você não tiver
equilíbrio, acaba se frustrando”.
De volta ao Brasil em
novembro, ele pretende retomar o trabalho no interior e seguir ensinando. “O
currículo agradece. Foi uma experiência incrível”. Agora com as portas abertas
pelo Senac-RN, Paulo mantém planos de retornar à Europa, mas a prioridade para
2026 é ficar próximo dos pais. “Pretendo voltar por causa do meu pai, que faz
diálise. Ele e minha mãe estão sozinhos. Quero acompanhá-los pelo menos até
2026. Se em 2027 estiver tudo bem, penso em retornar para Portugal e outros
países”.
Luiza se mudou do RS para o RN em
2016 – Foto: Cedida
Do RN para
o Mundo
Se Paulo representa o profissional potiguar que exporta talento, Luiza
Junqueira Pasquali, gaúcha radicada em Natal, simboliza o movimento inverso: o
de quem encontrou no Rio Grande do Norte o impulso para uma carreira
internacional. Graduada em nutrição no RN e formada em Gastronomia pelo
Senac-RN, ela hoje trabalha na Irlanda após passagens por Portugal e Itália.
A trajetória de Luiza mostra
outro aspecto do programa: o de atrair talentos de fora que acabam incorporando
o modo potiguar de se reinventar. “Cheguei a Natal em dezembro de 2016, a
convite do meu irmão. Sempre tive uma relação muito saudável com a alimentação,
e aqui decidi unir essa paixão à minha profissão”, relembra.
No Senac, Luiza encontrou a
formação que faltava para transformar o sonho em carreira. “Ali aprendi sobre
técnica, disciplina, trabalho em equipe e dedicação. O Senac foi a minha base,
tanto técnica quanto emocional, para tudo o que veio depois”.
Luiza participou do mesmo
programa de intercâmbio e passou duas temporadas em Portugal, onde atuou em
resorts e restaurantes no Algarve. Depois seguiu para a Itália, onde trabalhou
em confeitaria e gelateria. “Na Itália, aprendi o verdadeiro significado de
cozinhar com amor. O respeito pelo produto e a tradição me marcaram muito. Cada
país me ensinou algo diferente e deixou uma marca na minha forma de cozinhar”,
diz.
Hoje, vivendo na Irlanda, ela
diz que o intercâmbio foi o ponto de virada. “O Senac me deu base, confiança,
oportunidades e abriu as portas do mundo pra mim. Cada aprendizado me tornou
uma profissional mais completa. Quero unir nutrição, gastronomia e cultura para
desenvolver projetos que conectem saúde e alimentação. O Brasil sempre estará
no meu coração”.
Foto: Adriano Abreu
Aposta na formação que
atravessa fronteiras
Para o presidente do Sistema
Fecomércio RN, Marcelo Queiroz, o intercâmbio é um desdobramento natural da
política de qualificação profissional que o sistema vem consolidando. “A
parceria nasceu de um esforço de internacionalização empreendido pelo Sistema
Fecomércio RN, por meio do Senac, para abrir oportunidades de qualificação fora
do país. A partir de 2022 estabelecemos contatos e convênios com redes
hoteleiras portuguesas interessadas em profissionais qualificados”.
O presidente lembra que o
Senac-RN se tornou uma referência em qualificação profissional, com destaque
para o Complexo Hotel-Escola Barreira Roxa, em Natal. A instituição hoje é um
polo formador de mão de obra qualificada, que capacita cerca de 3,5 mil profissionais
por ano. Ele explica que as iniciativas estão alinhadas à agenda do Sistema
Fecomércio RN de promover missões técnicas e firmar parcerias estratégicas para
abertura de novos mercados.
Ainda segundo Queiroz, o
programa é resultado de uma visão de longo prazo que alia formação e
desenvolvimento econômico. “Vimos a necessidade de ampliar as possibilidades de
colocação e ascensão profissional dos nossos egressos, mas também a
oportunidade de fomentar a troca de experiências e boas práticas em turismo,
hotelaria e gastronomia. Isso eleva a competitividade do setor de serviços
potiguar”, destaca.
Pimenta é diretor do Senac-RN –
Foto: TN Play
Internacionalização que
transforma carreiras
Por trás das histórias individuais de Paulo e Luiza há uma engrenagem
institucional que vem ampliando o alcance da formação profissional do RN para
além das fronteiras. O diretor regional do Senac-RN, Raniery Pimenta, explica
que a escolha de Portugal e das áreas de gastronomia e hotelaria foi
estratégica.
“A proximidade linguística e
cultural com Portugal facilita a adaptação e a comunicação dos nossos
profissionais. Além disso, há uma demanda efetiva do mercado português, que
enfrenta forte sazonalidade turística e busca constantemente mão de obra qualificada”,
detalha.
Na avaliação de Raniery, o
programa já se consolidou como um dos pilares da política de empregabilidade
internacional do Senac-RN. “Lá, eles vivenciam experiências práticas em
ambientes de alto padrão, o que eleva o nível de qualificação desses profissionais”.
O diretor ressalta ainda que o retorno desses trabalhadores ao Brasil gera um
ciclo virtuoso. “Os profissionais voltam com novas competências e isso eleva a
qualidade do ensino que oferecemos. É um ciclo que se retroalimenta.”
Bruno Vital/Repórter

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