Mais de 500 alunos da Escola
Municipal Manoel Vicente de Paiva, em Parnamirim, passaram a contar com
biblioteca equipada com livros, notebooks e jogos pedagógicos, em um projeto
que integra leitura e educação ambiental de forma lúdica. No entanto, essa realidade
ainda é rara na rede pública do Rio Grande do Norte, onde muitas escolas
enfrentam falta de estrutura e profissionais bibliotecários, conforme denuncia
o Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinte-RN).
Na Escola Municipal Manoel Vicente de Paiva, a rotina escolar dos alunos do Ensino Fundamental I (6 a 10 anos) ganhou um novo capítulo: mais de 500 estudantes passam a contar com um acervo de 850 livros e seis notebooks novos, além de jogos pedagógicos, brinquedos educativos, instrumentos científicos e materiais de pesquisa.
Além do incentivo à leitura, o espaço, colorido e repleto de recursos visuais
interativos estimula alunos e professores a explorar temas sobre
sustentabilidade.
A diretora da escola, Elineide Cardoso, conta que, antes da reforma, a
biblioteca não despertava tanto interesse nos alunos, que agora formam filas e
aguardam ansiosamente para entrar no local. “Cada turma no seu horário e eles
ficam ansiosos para ir, eu percebi que o ambiente ajudou. O ambiente ajuda eles
a quererem ir para lá”, afirma.
Elineide Cardoso, diretora da
Escola Municipal Manoel Vicente de Paiva: “A gente tem que começar esse
trabalho de base”| Foto: Alex Régis
Ela observa que os alunos da escola não têm o hábito de ler, e que crianças
nessa idade preferem utilizar redes sociais e assistir televisão em vez da
leitura. “A gente tem que começar esse trabalho de base. Ele [o aluno] chega
aqui no primeiro ano e ele já tem essa rotina de estar nesse ambiente, de ter
esse momento de leitura com a mediadora. Eu acho que isso fortalece.” A
pedagoga defende que a leitura deve ser incentivada de forma prazerosa e não
apenas como uma obrigação pedagógica.
Os títulos foram selecionados para serem atrativos, incluindo principalmente
clássicos da literatura brasileira. “A gente vai ter que catalogar todos os
livros, carimbar. Eles também vão poder fazer o empréstimo, que já era feito.
Então existe todo um trabalho de conscientização pra manter esse livro”, pontua
a diretora.
O ambiente foi reformado pensado de forma a encantar os alunos. “Ficou mais
atrativo para eles. De não ser apenas esse leitor passivo, mas que seja também
um lugar de socialização diferente para eles”, disse.
Conforme a Secretaria Municipal de Educação de Parnamirim, 40 escolas na cidade
possuem bibliotecas ativas. “A Biblioteca do Futuro vai além do incentivo à
leitura: ela integra tecnologia e sustentabilidade ao processo educativo,
abordando temas como reciclagem, energias renováveis, o ciclo da água e o
sistema solar — tudo de forma lúdica e acessível”, afirmou a prefeitura.
A unidade recebeu, na última terça-feira (21), o projeto Biblioteca do Futuro,
uma iniciativa da Rede Educare, com patrocínio da Novelis. Os professores da
escola terão capacitação para aprender como incentivar a leitura de forma mais
eficiente.
Rede pública de Natal não
tem bibliotecários
Segundo dados da Secretaria
Municipal de Educação de Natal, nenhuma escola da rede municipal de ensino
possui bibliotecas. “Não há bibliotecas em funcionamento nas escolas e não há
bibliotecários na Rede”, declarou a pasta.
Ainda de acordo com a secretaria, “as unidades de ensino dispõem de Salas de
Leitura e Cantinhos de Leitura”. Diferentemente da biblioteca, que funciona
como um centro de pesquisa com acervo variado, catalogado e profissionais para
orientar alunos e professores, a sala de leitura é mais limitada: “não
denominamos de ‘biblioteca’, pois ainda não existe no quadro funcional da
Secretaria Municipal de Educação o cargo de bibliotecário”.
A Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e do Lazer do RN (SEEC) informou
que todas as escolas da rede estadual têm bibliotecas, mas nenhuma conta com
profissionais bibliotecários: “As bibliotecas das escolas estaduais são
coordenadas por mediadores de leitura, que são professores e técnicos
pedagógicos que recebem orientação e apoio técnico do Núcleo do Livro, Leitura
e Bibliotecas (NULLB)”.
Para a coordenadora geral do SINTE-RN, professora Fátima Cardoso, a falta de
bibliotecários nesses ambientes prejudica a qualidade do ensino. “Nós temos
também uma ausência de profissionais que sejam da área. Apesar de ter o curso
na universidade, não existe concurso público e isso faz com que em muitas
bibliotecas, se não a maioria, a gente não tenha um bibliotecário”, explica.
Ela acrescenta que o acervo das bibliotecas costuma ser vasto. “Em algumas
bibliotecas a gente encontra um acervo bom, um acervo que inclusive tem o
investimento do governo federal, porque o salário de educação, uma parte é
destinada para transporte e outra é para compra de livros, a compra de livros
na biblioteca.”
Em alguns casos, esses espaços não possuem estrutura adequada, com livros mal
conservados, ambiente apertado e abafado. “A ausência de estrutura provoca uma
ação que leva a escola a não trabalhar com os estudantes como deveria, porque a
biblioteca é uma sala de pesquisa, de promoção do conhecimento e que, se ela
não for estruturada, se ela não tiver sua infraestrutura adequada, ela não
comporta essa ação”, ressalta Fátima Cardoso.
Para ela, essa limitação atrapalha o professor a desenvolver no aluno uma visão
crítica sobre o mundo. “O professor muitas vezes deixa de fazer um trabalho
mais crítico, mais reflexivo, mais problematizador, porque as bibliotecas não
dão conta dessa tarefa. A gente tem visto muita queixa do pessoal com relação a
quem atua mesmo, quem atua nas bibliotecas, tem se queixado da estrutura que
tem.”
RN é o estado com menos
leitores do Brasil
O RN é o estado com o menor
número de leitores do país. Conforme a pesquisa mais recente do Retratos da
Leitura, de 2024, apenas 33% da população potiguar têm o hábito da leitura, o
índice mais baixo do Brasil.
De acordo com dados do MEC, o RN apresenta o terceiro pior índice de
alfabetização do país. O Indicador Criança Alfabetizada aponta que, em 2024,
60,7% das crianças da rede pública de ensino não estavam alfabetizadas até o
final do 2º ano do Ensino Fundamental.
Segundo a diretora do Núcleo de Educação da Infância (NEI), da UFRN, Denise
Bortoletto, o acesso às bibliotecas pode favorecer o processo de alfabetização.
“As bibliotecas escolares exercem um papel fundamental na formação de leitores
e futuros leitores, em especial quando inserida no contexto das escolas de
educação infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental”, afirma a
especialista.
Pessoas com hábito de leitura possuem maior capacidade cognitiva e pensamento
crítico, podendo ser desenvolvido desde a infância. “As bibliotecas
possibilitam a ampliação do contato das crianças com diferentes gêneros
textuais, autores e formatos de leitura, favorecendo o desenvolvimento da
curiosidade, da imaginação e da compreensão do mundo”, acrescenta.
A especialista cita que diversas ações podem contribuir para melhorar o
interesse pela leitura. Entre elas estão: o fortalecimento e a modernização das
bibliotecas escolares; a formação continuada de professores e mediadores de
leitura; e o acesso das escolas a programas nacionais e municipais de incentivo
à leitura, como o PNLD Literário e o Programa Nacional Biblioteca da Escola
(PNBE).
O incentivo à leitura dentro do ambiente familiar também é apontado como uma
estratégia fundamental para formar indivíduos com maior pensamento crítico. “O
contato livre, porém mediado por um adulto, e sem a ‘obrigação’ da leitura por
uma tarefa. Ler pelo deleite, pela satisfação do contato com a obra literária e
não para simplesmente relatar o conteúdo de uma obra”, explica.
Ela reforça a importância estratégica da biblioteca escolar nesse processo: “A
biblioteca escolar não pode ser vista apenas como um espaço físico, mas como um
ambiente de aprendizagem e de encantamento. Quando alinhada aos propósitos
pedagógicos do cotidiano pedagógico, ela torna-se fundamental na formação de
leitores autônomos, críticos e criativos.”
Recursos lúdicos também desempenham papel central no desenvolvimento do
interesse das crianças. “A criança tem nos recursos lúdicos o acesso a
informações do mundo social ao qual ela pertence. Assim, o diálogo entre a
leitura e a possibilidade de que essa aprendizagem seja favorecida por meio da
formação de um ambiente lúdico é extremamente importante na formação das
crianças”, conclui.

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