Duas em cada dez mulheres
pretas e pardas que fazem tratamento de câncer de mama se sentem discriminadas
por sua raça ou etnia. Os dados são preliminares e fazem parte de um
levantamento em andamento da Sociedade Brasileira de Mastologia – Regional Rio
de Janeiro (SBM-Rio). ![]()
![]()
A pesquisa, em parceria com o
Instituto Nosso Papo Rosa, avalia discriminação ou preconceito sofridos durante
etapas do atendimento e tratamento de câncer de mama, nos sistemas público e
privado de saúde do estado do Rio.
Na sondagem inicial, das 200
mulheres que responderam às perguntas, 40% se reconheceram como pretas ou
pardas. Desse universo, 20% desse universo relataram ter enfrentado algum tipo
de situação discriminatória, e 10% disseram não ter certeza se o que passaram
foi discriminação.
Ao serem questionadas sobre a
autoestima, cerca de 40% afirmaram que esse fator foi uma barreira para seguir
com o tratamento, sendo que 30% deixaram o convívio social e 25% pararam de
praticar atividade física. Os dados preliminares mostram ainda que 10% se
separaram ou foram abandonadas pelo companheiro ou companheira e 43% das
mulheres pretas e pardas entrevistadas não retornaram ao trabalho, após o
diagnóstico.
“São mulheres na faixa etária
de maior risco, entre 45 anos e 65 anos. E a gente teve, infelizmente, essa
surpresa de ver, nos dias de hoje, esse sentimento por parte dessas mulheres
que já estão sofrendo uma situação [de câncer] tão difícil, tão complicada,
principalmente se a gente pensar em sistema público, com toda dificuldade de
tratamento, e ainda têm que sofrer com esse racismo estrutural”, disse a
presidente da SBM-Rio e do Instituto Nosso Papo Rosa, doutora Maria Júlia Calas
A médica explicou que o
levantamento é aberto a pacientes de todas as raças e etnias, visando levantar
mais dados. “O questionário tem 25 perguntas. Isso abre um leque para outras
observações, atingindo outras áreas, como o retorno ao trabalho, por exemplo”.
A meta é concluir o
levantamento até outubro, mês dedicado à conscientização para a prevenção e o
controle do câncer de mama, em todo o mundo. “Para outubro, a gente quer ter
esses dados totalmente estruturados”, disse Maria Júlia.
As informações colhidas até
agora serão apresentadas no Simpósio Internacional de Mastologia (SimRio 2023),
que ocorre de 22 a 24 deste mês, no Rio de Janeiro.
LGBTQIA+
A médica conta que outro
destaque da pesquisa será o público LGBTQIA+, que ela vem rastreando desde
2020. O foco são os transgêneros, pessoas cuja identidade de gênero difere do
sexo atribuído ao nascer.
“A transgeneridade é o que nos
interessa mais, no sentido da possibilidade da doença, porque são pessoas que
fazem uso de hormônios para terem características próprias do sexo com o qual
se identificam e tomam hormônios em doses elevadas, por períodos muito longos.
Essas pessoas têm maior foco nosso de interesse na investigação do câncer de
mama”.
Informações já coletadas pela
SBM-Rio mostram que as mulheres trans (que nascem no sexo biológico masculino,
mas se identificam como mulher) fazem uso de hormônio feminino (estrogênio).
Com isso, a mama vai crescendo de volume, como elas desejam.
“Este hormônio, porém, aumenta
o risco de câncer de mama nessa população. A gente vê que nas mulheres trans, a
incidência de câncer de mama é maior do que nos homens cisgêneros. Aumenta o
risco pelo uso do estrogênio”.
A presidente da SBM Rio
advertiu, porém, que a literatura ainda não é robusta e não aponta por quanto
tempo essa mulher pode usar o hormônio sem risco ou em quanto tempo de uso pode
haver o risco de desenvolver o câncer. “Esses são dados que a gente ainda não
tem na literatura mundial. Estamos em busca dessas informações”.
Com relação à população
LBGTQIA+, Maria Júlia Calas apontou a existência de uma carência grande no
atendimento, pelo próprio preconceito e pela falta de cuidados de uma equipe
multiprofissional em atender de forma adequada essa população.
“A gente acaba perdendo
controle, diagnóstico, rastreio, perde a chance de cuidar dessa população,
sabendo que ela tem um risco maior em função do uso de hormônios”.
Para a presidente da SBM Rio, o tema traz um debate e a necessidade de uma abordagem diferente até para a classe médica. As mulheres trans também estão na pauta do Simpósio Internacional de Mastologia, do qual participam médicos de todo o país e do exterior, como mastologistas, oncologistas, radiologistas, entre outros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário