domingo, 23 de novembro de 2025

No RN, apenas 6% terminam o Ensino Médio com aprendizado adequado

Secretaria de Educação afirmou que os dados do anuário “refletem um histórico de abandono e ausência de investimentos“ | Foto: Magnus Nascimento

Informações do Anuário da Educação Básica 2025 revelam números alarmantes em relação à aprendizagem adequada de Língua Portuguesa e Matemática nas escolas públicas do RN. O Estado tem taxa de 6,4% (a terceira maior do Nordeste, atrás do Ceará, com 7,2%, e de Pernambuco, com 6,6%). Em outras palavras, de cada 100 estudantes potiguares, apenas 6,4 concluem o Ensino Médio com nível adequado. A média nacional é de 4,5%, e no Nordeste, 4,3%. Os dados são de 2023.

O estudante Diego Guilherme, de 18 anos, confessa que matemática não está entre as matérias que ele considera ter o melhor desempenho. Aluno do Atheneu, em Natal, Guilherme revelou que as dificuldades com cálculo fazem com que ele tenha menos estímulo para encarar a disciplina. “Essa dificuldade acaba gerando um desinteresse. Imagino que isso pode me afetar no futuro de alguma forma, como na participação de um concurso público, por exemplo”, fala o estudante.

Maria Beatriz, de 18 anos, também está concluindo o Ensino Médio. Ela comenta não ser fácil lidar com fórmulas e operações matemáticas, questão que lhe acompanhou durante toda a trajetória escolar. “Acho que não aprendi o suficiente. Creio que as mudanças que tiveram, com o novo Ensino Médio, contribuíram para a falta de aprendizado adequado nesta etapa, porque tudo ficou muito confuso”, relata.

Gustavo Fernandes, mestre em Educação e especialista em Gestão Escolar, analisa que o baixo índice de aprendizagem na última fase da Educação Básica está diretamente relacionado às primeiras etapas. Segundo o anuário, nos anos iniciais do Ensino Fundamental (do 1º ao 5º ano), o índice de aprendizagem de alunos de escolas públicas no RN em Língua Portuguesa e Matemática ficou em 19,6%; nos anos finais do Ensino Fundamental (do 6º ao 9º ano), a taxa ficou em 6,6% nas escolas públicas do estado.

“Existem municípios onde mais de 50% dos alunos não são alfabetizados no Ensino Fundamental. Então, esse aluno chega no Ensino Médio e não consegue ter um bom aproveitamento por conta das lacunas acumuladas. É também no Ensino Médio onde o problema se potencializa, principalmente na área de exatas”, discorre Fernandes, que é secretário de Educação no Município de Nísia Floresta, na Grande Natal.

Sobre o desempenho da rede estadual, a SEEC informou que, para buscar reverter este e os demais dados disponibilizados pelo anuário, vem executando um conjunto de iniciativas para fortalecer o ensino. “Entre as iniciativas estão a reestruturação física das escolas, com um investimento superior a R$ 420 milhões com obras de reforma, ampliação e modernização dos espaços; a ampliação da conectividade, com instalação de internet de alta velocidade em toda a rede e entrega de novos equipamentos de informática, com investimento superior a R$ 77 milhões”, disse a pasta.

A Secretaria mencionou que tem implementado ações de recomposição das aprendizagens voltadas à recuperação das habilidades essenciais; além da intensificação da Busca Ativa Escolar, realizada em parceria com os municípios para assegurar o retorno dos estudantes que se encontram fora da sala de aula. “Somam-se a essas ações o fortalecimento das iniciativas de formação docente e o desenvolvimento de políticas que integram inovação, tecnologia e novas metodologias de ensino”, escreveu a SEEC em nota.

Sobre os baixos níveis de aprendizagem no Ensino Fundamental, de responsabilidade majoritariamente dos municípios, a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação no RN (Undime/RN), explicou que o cenário é resultado de fatores como desigualdades sociais, lacunas históricas de formação docente e ausência prolongada de políticas nacionais de recomposição das aprendizagens.

“Para reverter esse quadro, a Undime defende a continuidade e o fortalecimento de ações como expansão da educação integral, formação de professores, recomposição das aprendizagens, avaliações diagnósticas e gestão educacional estruturada. Os dados mostram que o estado está avançando e que os municípios têm atuado de forma comprometida para melhorar a qualidade da educação”, comentou a entidade.

Evasão e reprovação são frequentes

Mesmo com uma melhora de 5,4 pontos percentuais em 10 anos, o Rio Grande do Norte apresentou uma taxa de reprovação de 11,8% no Ensino Médio em 2024, a mais alta entre todos os estados do Brasil e o DF e bem acima das médias nacional (5,1%) e do Nordeste (4,4%). O RN também ficou na lanterna do País no ranking que mede o abandono escolar nesta etapa, com taxa de 6,8%, novamente acima dos índices nacional (3,2%) e do Nordeste (3,5%). Os números de evasão e reprovação também incluem a rede federal e privada.

Em 2014, as taxas de reprovação e abandono escolar no Ensino Médio potiguar eram de 17,2% e de 10%, respectivamente. No ano passado, a segunda unidade federativa com maior índice do País em reprovação nesta etapa foi o Rio de Janeiro (11,2%); quanto ao abandono, a Bahia foi o segundo estado brasileiro com maior taxa (5,8%). Em nota, a Secretaria de Estado da Educação (SEEC/RN) afirmou que os dados do anuário “refletem um histórico de abandono e ausência de investimentos estruturantes que marcaram a educação pública potiguar por muitos anos”.

Segundo a pasta, “desde o início da atual gestão, o Governo implantou uma estratégia contínua de recuperação da rede estadual, com foco na reestruturação das unidades escolares, na melhoria da infraestrutura e na valorização das condições de ensino e aprendizagem”. A SEEC pontuou que os resultados desse processo não são imediatos. “A superação das desigualdades educacionais, bem como a elevação dos indicadores de aprendizagem, demanda tempo, continuidade das políticas e ações sistemáticas em todas as regiões do estado”.

Pessoa em cima de mesa

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Maioria dos alunos sai sem saber matemática básica | Foto: Magnus Nascimento

Para Gustavo Fernandes, mestre em Educação e especialista em Gestão Escolar, os índices de reprovação e abandono no Ensino Médio potiguar são puxados por outro dado que coloca o estado na primeira posição do ranking nacional e mostra o quanto o cenário local precisa de políticas públicas para avançar: é a chamada distorção idade-série, ou seja, o atraso na trajetória escolar, que registra taxa de 34% no RN, segundo o anuário.

“Essa distorção ainda é muito alta”, aponta. O especialista afirma ser necessário o que ele chama de “acompanhamento severo” nas escolas da rede, especialmente naquelas mais afastadas dos grandes centros, para mudar o quadro. Fernandes avalia que as razões dos variados problemas estão todas interligadas e cita a falta de professores como uma das principais causas dos gargalos na rede. “O abandono escolar e a baixa aprendizagem estão diretamente relacionados à prática docente se nós considerarmos que a ausência de professores em sala de aula é muito forte”, avalia.

“Sem aulas, os alunos encontram um ambiente escolar pouco atrativo. É preciso pensar em uma escola que produza uma motivação maior para garantir a permanência e o aprendizado do estudante. E isso se faz com um acompanhamento eficaz que passa, de modo muito importante, pela presença dos professores em sala.”, diz.

Ensino Fundamental em crise

Não é apenas no Ensino Médio que o RN apresenta os dados mais elevados do Brasil quanto ao desempenho dos estudantes. De acordo com o Anuário da Educação Básica, nos anos iniciais do Ensino Fundamental, o índice de reprovação foi de 4,7% em 2024, o segundo maior do País (o Pará ocupa a primeira posição, com taxa de 5%). Já nos anos finais do Ensino Fundamental (do 6º ao 9º ano), a taxa de reprovação entre estudantes potiguares é de 13,8% (o mais alto do Brasil, seguido por Sergipe, com 8,8%).

Para a Undime, apesar dos dados, os municípios têm avançado de forma consistente. “Dados do MEC mostram que o RN criou 13.327 novas matrículas em 2023, ampliou em 8.484 o número de matrículas entre os Censos de 2023 e 2024 e alcançou 21.811 matrículas declaradas, o que representa 199% de execução em relação ao pactuado com o Programa Escola em Tempo Integral. Esse crescimento evidencia o esforço das redes municipais em reorganizar infraestrutura, equipes e práticas”, assinalou.

Taxa de reprovação no Ensino Médio (ano base 2024)

RN: 11,8%

RJ: 11,2%

SC: 10,2%

RS: 9,9%

PB: 8,5%

DF: 8,4%

AC: 7,8%

AP: 7,5%

RR: 7,2%

MG: 6,6%

AM: 6,3%

MS: 5,8%

SE: 5,5%

AL: 5,3%

RO: 5,2%

PR: 5,1%

BA: 4,9%

MA: 4,4%

TO: 4,1%

MT: 3,5%

SP: 3,1%

PE: 3%

ES: 2,2%

GO: 1,9%

PI: 1,5%

CE: 1,2%

PA: 1,1%

Taxa de abandono no Ensino Médio (ano base 2024)

RN: 6,8%

BA: 5,8%

PB: 5,8%

MG: 5,2%

AC: 4,8%

RS: 4,6%

RJ: 4,5%

SC: 4,1%

AM: 4%

RO: 4%

AL: 3,7%

RR: 3,6%

AP: 3,5%

MA: 3,3%

MT: 2,9%

DF: 2,7%

SP: 2,1%

MS: 2%

TO: 2%

PA: 1,9%

CE: 1,8%

SE: 1,6%

PR: 1,3%

GO: 1,2%

ES: 1,1%

PE: 0,7%

Fonte: Anuário da Educação Básica 2025

Felipe Salustino/Repórter

Tribuna do Norte

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