sábado, 8 de novembro de 2025

Falta de data centers pode deixar RN para trás na corrida tecnológica

O Ceará já tem 12 data centers em operação. Outros estados do Nordeste também já têm equipamentos instalados | Foto: Alex Régis

Em meio a uma era marcada pelo processamento contínuo de bilhões de dados, os estados brasileiros travam uma corrida para atrair e instalar estruturas capazes de armazená-los: os data centers. No Rio Grande do Norte, porém, essa tecnologia ainda é uma promessa. O estado engatinha na construção de infraestrutura e na definição de regras para o setor, enquanto o Ceará desponta como líder regional, com 12 data centers já em operação. Especialistas reconhecem o potencial potiguar para receber investimentos nessa área, mas alertam que é preciso transformar o discurso em ações mais concretas.

Um dos passos necessários para criar um ambiente favorável a esse tipo de empreendimento é o avanço na regulação do uso de baterias, fundamentais para garantir segurança energética aos data centers. O tema ganhou força nos últimos dias: o Ministério de Minas e Energia (MME) deve publicar, na próxima segunda-feira (10) a portaria que abre consulta pública sobre o leilão de baterias previsto para 2026, conforme anunciou o ministro Alexandre Silveira. No âmbito estadual, o Governo do Rio Grande do Norte se prepara para submeter, na terça-feira (11), a legislação para licenciamento de baterias à análise do Conselho Estadual de Meio Ambiente, segundo informou o secretário adjunto de Desenvolvimento Econômico, Hugo Fonseca.

Darlan Santos, presidente do Cerne (Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia), afirma que o maior gargalo do RN para a atração de data centers ainda é a falta de regulamentação ambiental. “Precisamos avançar não apenas para os data centers, mas também para os sistemas de bateria, que podem ajudar a dar viabilidade técnica e econômica para a implementação de data centers no estado”, avalia.

De acordo com Sérgio Azevedo, presidente da Comissão Temática de Energias Renováveis da Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte (Fiern), se o RN não regulamentar o licenciamento a tempo do leilão, poderá ficar fora do certame.

Homem de terno e gravata com celular na mão

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Sérgio Azevedo aponta que RN pode ficar de fora de leilão | Foto: Alex Régis

Segundo Hugo Fonseca, o estado finalizou os trâmites regulatórios do licenciamento da atividade de data centers. Ele diz que o RN concluiu os estudos técnicos e a proposição da resolução para o Conselho Estadual de Meio Ambiente para instalação e operação da tecnologia no estado. O conselho deve analisar a resolução ainda este ano.

Outro gargalo para instalar data centers está na falta de cabos submarinos para comportar o processamento dos dados. Reconhecendo isso, o Governo do Estado apresentou ao Ministério das Comunicações, em setembro deste ano, estudos voltados à atração desses cabos. Agora, diz Fonseca, o estado espera receber uma zona de ancoragem para cabos na Política Nacional de Cabos Submarinos, que deve sair em 2025.

Ele lembra que a única conexão desses cabos no RN já atingiu o limite operacional e tem tecnologia defasada. “A gente precisa substituir esse cabo e atrair novos data centers com isso, para ter uma capacidade de transmissão de dados e informações muito mais rápida com fibra óptica, com tecnologia mais avançada”.

Homem de óculos e gravata

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Segundo Hugo Fonseca, da Sedec, Estado vai regulamentar tema | Foto: Alex Régis

Vantagens

Apesar dos desafios para instalação da tecnologia, o Rio Grande do Norte se posiciona como um território vantajoso à atração e à operação de data centers. Para Darlan Santos, o estado tem o maior ativo de atração: “energia disponível e com preço módico”. “Vários parques eólicos ou fotovoltaicos de grande porte podem ser locais de interesse para ampliação de suas atividades por meio do uso de data centers”.

Erich Rodrigues, CEO do Grupo Interjato e membro do grupo de atração de data centers criado pelo Governo do RN, frisa que “o RN tem disponibilidade energética renovável, baixo risco de desastres naturais, boa estabilidade geológica, conectividade crescente via cabos submarinos e um custo operacional competitivo”

Ainda segundo ele, o ambiente universitário e técnico pode contribuir na formação de profissionais especializados para a tecnologia. “O RN está amadurecendo rapidamente e tem a chance de se tornar polo de data centers do Nordeste voltado ao processamento de inteligência artificial”, diz Rodrigues.

Conforme o empresário, o RN caminha para uma articulação entre governo, setor privado e academia, que deve transformar o potencial em política de atração concreta. “Ainda precisamos evoluir em dois pontos fundamentais: infraestrutura elétrica de transmissão, para garantir fornecimento estável e redundante, e previsibilidade regulatória e fiscal, que é o que atrai investimentos de longo prazo. O investidor de data center pensa em ciclos de 20 a 40 anos”, pondera.

Estados do Nordeste já têm data centers

Enquanto ainda não instalou nenhum data center, o Rio Grande do Norte vê seu vizinho, o Ceará, se tornar um dos principais polos para a tecnologia entre os estados brasileiros, com 12 centros de armazenamento e processamento de informações. Segundo a plataforma Data Center Map, no Nordeste, Pernambuco tem três instalações, Paraíba tem duas, e Piauí e Sergipe têm uma. No Brasil, existem 186 data centers

Na visão de Erich Rodrigues, falta planejamento estratégico para que o RN atraia os investimentos necessários. “O estado pode adotar diretrizes claras: mapear áreas com melhor infraestrutura elétrica e óptica, criar uma política de incentivos fiscais e ambientais específica e promover a formação técnica de mão de obra local”.

Os benefícios são diversos: “O data center não é apenas uma infraestrutura de TI; atrai [também] empresas de nuvem, startups, provedores de conteúdo, serviços financeiros e governos”, Rodrigues afirma. A tecnologia gera uma cadeia de valor que envolve energia, conectividade, engenharia, manutenção, segurança e capacitação técnica. “O efeito multiplicador sobre o PIB é expressivo, porque cria oportunidades de alto valor agregado e estimula o surgimento de um ecossistema digital local”.

Hugo Fonseca avalia que os data centers devem gerar uma cultura de desenvolvimento de inteligência artificial, ampliando a digitalização de processos e procedimentos no RN. Além disso, a demanda de empresas por inteligência artificial cresce e fortalece a procura por data centers.

Outra alternativa para os data centers é a possibilidade de usar a energia elétrica produzida em excesso para alimentá-los, o que evita os curtailments – cortes de geração do sistema elétrico. Caso não fosse cortada, a energia em excesso poderia sobrecarregar o sistema e causar apagões.

Os cortes são uma das principais reclamações do setor de renováveis, pois geram prejuízo financeiro e travam a operação de empreendimentos em determinados horários. Fonseca observa que os projetos de geração de energia geram muito mais energia do que o sistema consegue transmitir.

Governo elabora política de incentivo

O Rio Grande do Norte, além de pleitear o recebimento de zonas de ancoragem para cabos submarinos, elabora uma política de incentivo a data centers. A articulação é da Sedec, da Secretaria de Estado da Fazenda e da Secretaria de Estado do Planejamento, do Orçamento e Gestão.

De acordo com Fonseca, além disso, “o estado está desenvolvendo um estudo para a criação de uma parceria público-privada para a instalação de um data center próprio. Será um data center relativamente robusto, que vai centralizar todos os dados do Governo do Estado em um único data center”.

“As inteligências artificiais que estão em fase de desenvolvimento no estado do Rio Grande do Norte, quando entrarem em operação, vão precisar de um data center robusto para rodar todos os níveis de dados e informações”, diz.

Segundo ele, a expectativa é ter tanto data centers na rede pública quanto na privada. A sua previsão é de que haja data centers instalados no RN já no final de 2026 e em 2027. Enquanto isso, estruturas de armazenamento de dados menores já funcionam em instituições de ensino e indústrias potiguares.

Demanda elétrica

O RN se insere no crescimento da demanda por energia elétrica para conexão de data centers. Em junho deste ano, o Ministério de Minas e Energia registrou 52 pedidos de acesso à Rede Básica do Sistema Interligado Nacional (SIN) em cinco estados. O RN aparece com quatro pedidos em fase inicial para conexões, sendo uma em Riachuelo e três em Assú.

Em nota, o MME afirma que o estado “apresenta uma demanda potencial significativa no segmento de data centers, com quatro projetos protocolados e com análises em curso no MME, buscando acesso à Rede Básica do Sistema Interligado Nacional”. Os quatro projetos somam uma capacidade acumulada que pode alcançar aproximadamente 710 MW até 2038. No Brasil, conforme estimativas dos consumidores, a demanda máxima pode alcançar 13,2 GW até 2035.

“Sobre a questão dos prazos, na etapa sob responsabilidade do MME, desde a documentação inicial até a publicação da portaria reconhecendo a conexão como ponto de mínimo custo global, eles podem variar, dependendo do volume de projetos na fila de estudos em análise no Departamento, e da complexidade da avaliação técnica nos pontos de conexão solicitados”, explica a nota ministerial.

Após a publicação da portaria, iniciam-se as demais etapas, sob a gestão do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) – a emissão do Parecer de Acesso, a assinatura do Contrato de Uso do Sistema de Transmissão (CUST) e a autorização da Agência.

“A viabilidade técnica e comercial da conexão depende, portanto, dessa análise e aprovação do ONS, e fatores de mercado, financiamento e estratégia empresarial são determinantes no processo de tomada de decisão de cada empresa”, conclui a nota.

Fernando Azevêdo/Repórter

Tribuna do Norte

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