O Ceará já tem 12 data centers em operação. Outros estados do Nordeste também já têm equipamentos instalados | Foto: Alex Régis
Em meio a uma era marcada pelo
processamento contínuo de bilhões de dados, os estados brasileiros travam uma
corrida para atrair e instalar estruturas capazes de armazená-los: os data
centers. No Rio Grande do Norte, porém, essa tecnologia ainda é uma promessa. O
estado engatinha na construção de infraestrutura e na definição de regras para
o setor, enquanto o Ceará desponta como líder regional, com 12 data centers já
em operação. Especialistas reconhecem o potencial potiguar para receber
investimentos nessa área, mas alertam que é preciso transformar o discurso em
ações mais concretas.
Um dos passos necessários para
criar um ambiente favorável a esse tipo de empreendimento é o avanço na
regulação do uso de baterias, fundamentais para garantir segurança energética
aos data centers. O tema ganhou força nos últimos dias: o Ministério de Minas e
Energia (MME) deve publicar, na próxima segunda-feira (10) a portaria que abre
consulta pública sobre o leilão de baterias previsto para 2026, conforme
anunciou o ministro Alexandre Silveira. No âmbito estadual, o Governo do Rio
Grande do Norte se prepara para submeter, na terça-feira (11), a legislação
para licenciamento de baterias à análise do Conselho Estadual de Meio Ambiente,
segundo informou o secretário adjunto de Desenvolvimento Econômico, Hugo
Fonseca.
Darlan Santos, presidente do
Cerne (Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia), afirma que o
maior gargalo do RN para a atração de data centers ainda é a falta de
regulamentação ambiental. “Precisamos avançar não apenas para os data centers,
mas também para os sistemas de bateria, que podem ajudar a dar viabilidade
técnica e econômica para a implementação de data centers no estado”, avalia.
De acordo com Sérgio Azevedo,
presidente da Comissão Temática de Energias Renováveis da Federação das
Indústrias do Rio Grande do Norte (Fiern), se o RN não regulamentar o
licenciamento a tempo do leilão, poderá ficar fora do certame.
Sérgio Azevedo aponta que RN pode
ficar de fora de leilão | Foto: Alex Régis
Segundo Hugo Fonseca, o estado
finalizou os trâmites regulatórios do licenciamento da atividade de data
centers. Ele diz que o RN concluiu os estudos técnicos e a proposição da
resolução para o Conselho Estadual de Meio Ambiente para instalação e operação
da tecnologia no estado. O conselho deve analisar a resolução ainda este ano.
Outro gargalo para instalar
data centers está na falta de cabos submarinos para comportar o processamento
dos dados. Reconhecendo isso, o Governo do Estado apresentou ao Ministério das
Comunicações, em setembro deste ano, estudos voltados à atração desses cabos.
Agora, diz Fonseca, o estado espera receber uma zona de ancoragem para cabos na
Política Nacional de Cabos Submarinos, que deve sair em 2025.
Ele lembra que a única conexão
desses cabos no RN já atingiu o limite operacional e tem tecnologia defasada.
“A gente precisa substituir esse cabo e atrair novos data centers com isso,
para ter uma capacidade de transmissão de dados e informações muito mais rápida
com fibra óptica, com tecnologia mais avançada”.
Segundo Hugo Fonseca, da Sedec,
Estado vai regulamentar tema | Foto: Alex Régis
Vantagens
Apesar dos desafios para
instalação da tecnologia, o Rio Grande do Norte se posiciona como um território
vantajoso à atração e à operação de data centers. Para Darlan Santos, o estado
tem o maior ativo de atração: “energia disponível e com preço módico”. “Vários
parques eólicos ou fotovoltaicos de grande porte podem ser locais de interesse
para ampliação de suas atividades por meio do uso de data centers”.
Erich Rodrigues, CEO do Grupo
Interjato e membro do grupo de atração de data centers criado pelo Governo do
RN, frisa que “o RN tem disponibilidade energética renovável, baixo risco de
desastres naturais, boa estabilidade geológica, conectividade crescente via
cabos submarinos e um custo operacional competitivo”
Ainda segundo ele, o ambiente
universitário e técnico pode contribuir na formação de profissionais
especializados para a tecnologia. “O RN está amadurecendo rapidamente e tem a
chance de se tornar polo de data centers do Nordeste voltado ao processamento
de inteligência artificial”, diz Rodrigues.
Conforme o empresário, o RN
caminha para uma articulação entre governo, setor privado e academia, que deve
transformar o potencial em política de atração concreta. “Ainda precisamos
evoluir em dois pontos fundamentais: infraestrutura elétrica de transmissão,
para garantir fornecimento estável e redundante, e previsibilidade regulatória
e fiscal, que é o que atrai investimentos de longo prazo. O investidor de data
center pensa em ciclos de 20 a 40 anos”, pondera.
Estados do Nordeste já têm
data centers
Enquanto ainda não instalou
nenhum data center, o Rio Grande do Norte vê seu vizinho, o Ceará, se tornar um
dos principais polos para a tecnologia entre os estados brasileiros, com 12
centros de armazenamento e processamento de informações. Segundo a plataforma
Data Center Map, no Nordeste, Pernambuco tem três instalações, Paraíba tem
duas, e Piauí e Sergipe têm uma. No Brasil, existem 186 data centers
Na visão de Erich Rodrigues,
falta planejamento estratégico para que o RN atraia os investimentos
necessários. “O estado pode adotar diretrizes claras: mapear áreas com melhor
infraestrutura elétrica e óptica, criar uma política de incentivos fiscais e ambientais
específica e promover a formação técnica de mão de obra local”.
Os benefícios são diversos: “O
data center não é apenas uma infraestrutura de TI; atrai [também] empresas de
nuvem, startups, provedores de conteúdo, serviços financeiros e governos”,
Rodrigues afirma. A tecnologia gera uma cadeia de valor que envolve energia,
conectividade, engenharia, manutenção, segurança e capacitação técnica. “O
efeito multiplicador sobre o PIB é expressivo, porque cria oportunidades de
alto valor agregado e estimula o surgimento de um ecossistema digital local”.
Hugo Fonseca avalia que os
data centers devem gerar uma cultura de desenvolvimento de inteligência
artificial, ampliando a digitalização de processos e procedimentos no RN. Além
disso, a demanda de empresas por inteligência artificial cresce e fortalece a
procura por data centers.
Outra alternativa para os data
centers é a possibilidade de usar a energia elétrica produzida em excesso para
alimentá-los, o que evita os curtailments – cortes de geração do sistema
elétrico. Caso não fosse cortada, a energia em excesso poderia sobrecarregar o
sistema e causar apagões.
Os cortes são uma das
principais reclamações do setor de renováveis, pois geram prejuízo financeiro e
travam a operação de empreendimentos em determinados horários. Fonseca observa
que os projetos de geração de energia geram muito mais energia do que o sistema
consegue transmitir.
Governo elabora política de
incentivo
O Rio Grande do Norte, além de
pleitear o recebimento de zonas de ancoragem para cabos submarinos, elabora uma
política de incentivo a data centers. A articulação é da Sedec, da Secretaria
de Estado da Fazenda e da Secretaria de Estado do Planejamento, do Orçamento e
Gestão.
De acordo com Fonseca, além
disso, “o estado está desenvolvendo um estudo para a criação de uma parceria
público-privada para a instalação de um data center próprio. Será um data
center relativamente robusto, que vai centralizar todos os dados do Governo do
Estado em um único data center”.
“As inteligências artificiais
que estão em fase de desenvolvimento no estado do Rio Grande do Norte, quando
entrarem em operação, vão precisar de um data center robusto para rodar todos
os níveis de dados e informações”, diz.
Segundo ele, a expectativa é
ter tanto data centers na rede pública quanto na privada. A sua previsão é de
que haja data centers instalados no RN já no final de 2026 e em 2027. Enquanto
isso, estruturas de armazenamento de dados menores já funcionam em instituições
de ensino e indústrias potiguares.
Demanda elétrica
O RN se insere no crescimento
da demanda por energia elétrica para conexão de data centers. Em junho deste
ano, o Ministério de Minas e Energia registrou 52 pedidos de acesso à Rede
Básica do Sistema Interligado Nacional (SIN) em cinco estados. O RN aparece com
quatro pedidos em fase inicial para conexões, sendo uma em Riachuelo e três em
Assú.
Em nota, o MME afirma que o
estado “apresenta uma demanda potencial significativa no segmento de data
centers, com quatro projetos protocolados e com análises em curso no MME,
buscando acesso à Rede Básica do Sistema Interligado Nacional”. Os quatro projetos
somam uma capacidade acumulada que pode alcançar aproximadamente 710 MW até
2038. No Brasil, conforme estimativas dos consumidores, a demanda máxima pode
alcançar 13,2 GW até 2035.
“Sobre a questão dos prazos,
na etapa sob responsabilidade do MME, desde a documentação inicial até a
publicação da portaria reconhecendo a conexão como ponto de mínimo custo
global, eles podem variar, dependendo do volume de projetos na fila de estudos em
análise no Departamento, e da complexidade da avaliação técnica nos pontos de
conexão solicitados”, explica a nota ministerial.
Após a publicação da portaria,
iniciam-se as demais etapas, sob a gestão do Operador Nacional do Sistema
Elétrico (ONS) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) – a emissão do
Parecer de Acesso, a assinatura do Contrato de Uso do Sistema de Transmissão
(CUST) e a autorização da Agência.
“A viabilidade técnica e
comercial da conexão depende, portanto, dessa análise e aprovação do ONS, e
fatores de mercado, financiamento e estratégia empresarial são determinantes no
processo de tomada de decisão de cada empresa”, conclui a nota.
Fernando Azevêdo/Repórter
Tribuna do Norte

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