
Com atraso e sob pressão
internacional, o governo federal lançou ontem a plataforma oficial de
hospedagem para a COP-30, marcada para entre 10 e 21 de novembro. O servidor
chegou a ficar sobrecarregado em alguns momentos, formando uma fila de acessos
com mais de 2 mil interessados. O embaixador André Corrêa do Lago, presidente
cúpula, também negou a possibilidade de transferir o evento, no todo ou em
parte, de Belém (PA), ressaltando que “não há plano B”.
O site oficial, que deveria
ter ficado pronto entre março e junho, foi lançado com 2,7 mil leitos em
hotéis, casas e apartamentos privados a preços variados. Uma busca mostra
cobranças que chegam a US$ 8 mil por casas de alto padrão. Segundo a Secretaria
Extraordinária da COP-30, novos apartamentos serão adicionados diariamente.
Cabines em dois navios de cruzeiro que ficarão atracados no Porto de Outeiro, a
20 quilômetros do local do evento, vão adicionar até 6 mil leitos.
Como mostrou o Estadão, a
crise relacionada aos preços de acomodação ofertados durante a conferência do
clima da ONU na capital paraense se estende há meses, incluindo manifestações
entre representações diplomáticas, e chegou a um ponto crítico nesta semana com
uma carta internacional cobrando providências.
PREOCUPAÇÃO
Ontem, Corrêa do Lago admitiu
que a pressão por dificuldades logísticas atrapalha as discussões temáticas e
virou uma “questão política”. Ele reafirmou que tanto a conferência temática
quanto a reunião prévia de chefes de Estado e de governo – que já havia sido
adiantada por essas questões logísticas – serão realizadas na capital paraense.
“Se a gente não acreditasse que tem soluções, sim, logicamente se passaria para
um plano B. Não estamos nesse momento. Vamos continuar no plano A até se chegar
a alguma outra conclusão. Estamos longe disso”, disse a CEO da COP-30, Ana
Toni.
O governo chegou anteriormente
a notificar grandes redes hoteleiras paraenses, mas foi acusado de tentar
“interferir” no mercado privado de demanda e oferta. Depois colocou em prática
reformas de escolas e incentivou até adaptação de motéis. “A questão está
interferindo no tempo em que no fundo nós deveríamos estar discutindo questões
de substância. Ganhou dimensão ao ser formalizada pelos países na reunião do
birô e, ao virar uma discussão na imprensa, que é totalmente legítima, tem um
impacto sobre a negociação. O que nos interessa a todos vão ser os resultados
substantivos da COP”, disse Lago.
A questão é o preço que os
países mais pobres podem pagar nas opções de alojamento disponíveis. As diárias
oferecidas pelos governos e com suporte da ONU têm valor menor do que o custo
de hospedagem, segundo o embaixador. O valor de subsistência é de US$ 143, para
acomodação e alimentação. Essas delegações solicitaram que os quartos variem
entre US$ 50 e US$ 70. Mas nas datas da conferência os valores estão muito mais
elevados – até 15 vezes acima do normal. Ontem, o Estadão encontrou pacotes
fechados por até R$ 1,5 milhão
Segundo a Secretaria
Extraordinária da COP-30, vinculada à Casa Civil, há hoje 2,5 mil quartos
individuais disponíveis com tarifas entre US$ 100 e US$ 600. Os países
classificados pela ONU como menos desenvolvidos e pequenos Estados insulares
terão direito a 15 quartos individuais cada para delegações, com tarifas entre
US$ 100 e US$ 200. Os demais países terão direito a um mínimo de 10 quartos
individuais por delegação com diárias entre US$ 220 e US$ 600. “O que estamos
fazendo é assegurar o número mínimo de quartos a preços possíveis. No entanto,
os preços mais baratos que foram oferecidos não estão sendo aceitos pelos
africanos e países de menor desenvolvimento relativo”, afirmou o embaixador.
O QUE DIZEM OS HOTÉIS
A Associação Brasileira da
Indústria de Hotéis do Pará (ABIH-Pa) rebateu as declarações de Lago. “No
início de junho deste ano, a hotelaria de Belém foi oficialmente solicitada a
disponibilizar 500 apartamentos destinados a delegações de países economicamente
menos favorecidos, cujos custos são subsidiados pela ONU”, disse, em nota.
(Colaborou Juliana Domingos de Lima)
Réplica
Associação de hotéis diz ter sido procurada oficialmente para oferecer 500
lugares.
Perguntas & Respostas
Série de países cobrou o
Brasil e nova reunião vai acontecer no dia 11.
Como funciona a COP?
O evento global reúne líderes
mundiais, cientistas, organizações não governamentais e representantes da
sociedade civil em sessões de discussões sobre ações para combater as mudanças
do clima.
Quais serão os principais
temas a serem tratados?
Redução de emissões de gases
de efeito estufa; adaptação às mudanças climáticas; financiamento climático
para países em desenvolvimento; tecnologias de energia renovável e soluções de
baixo carbono; preservação de florestas e biodiversidade; Justiça climática e
impactos sociais das mudanças climáticas.
Como surgiu esta crise?
Como mostrou o Estadão, desde
o início do ano representações diplomáticas se queixavam dos valores cobrados
por hospedagem em Belém – até 15 vezes acima do normal, conforme admitiu o
próprio presidente da cúpula. Um encontro de emergência foi realizado nesta
semana, nas Nações Unidas, para debater soluções para o problema. O agravamento
da insatisfação dos outros países veio à tona com uma entrevista do tanzaniano
Richard Muyungi, presidente do Grupo Africano de Negociadores, que representa
54 nações desse continente. Uma nova reunião em 11 de agosto deve discutir a
questão e trazer as respostas do Brasil. Não está claro, ainda, se o pedido
para troca parcial ou integral do local do evento poderá ou não ser acatado
pelas Nações Unidas.
Quem assina a carta pedindo
que se reconsidere Belém?
Entre os signatários há
representantes de dois blocos (um de países menos desenvolvidos e outro de
negociadores africanos), além de 29 países. A lista tem AGN (Africa Group of
Negotiators, grupo de negociadores de países africanos), Áustria, Bélgica, Belize,
Canadá, Ilhas Cook, Chipre, República Checa, Estônia, Finlândia, Guatemala,
Islândia, Irlanda, Coreia do Sul, Letônia, LDC (Least Development Countries,
grupo de países menos desenvolvidos), Lituânia, Luxemburgo, Malta, Holanda,
Noruega, Palau, Panamá, Polônia, IlhasMarshall, Eslováquia, África do Sul,
Suécia e Suíça.
Estadão Conteúdo
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