A alíquota apresentada na
Carta de Conjuntura do Ipea é superior à proposta pelo governo no Projeto de Lei (PL) 1087/2025, que altera a legislação do
imposto sobre a renda e está em tramitação no Congresso Nacional.
Para garantir a isenção da
parcela da população que recebe menos, a proposta enviada
pelo governo ao parlamento define a cobrança de uma alíquota
progressiva, de até 10%, para quem ganha acima de R$ 600 mil por ano, ou R$ 50
mil por mês. Apenas 2% dos contribuintes estão nessa situação. A alíquota
máxima, de 10%, passará a ser cobrada das pessoas que ganham a partir de R$ 1,2
milhão por ano, os considerados super ricos, 0,7% dos contribuintes.
Para o Ipea, no entanto, a
alíquota cobrada dos mais ricos deve ser maior. No cálculo, o técnico de
planejamento e pesquisa do Ipea Pedro Humberto Carvalho, que assina o estudo,
considerou que o valor máximo da tributação efetiva em 2022 foi de 14,1%,
percentual pago pelo grupo com renda média mensal de aproximadamente R$16 mil.
Para ele, a alíquota dos mais ricos deve ser semelhante a esta e não inferior.
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Além disso, Carvalho defende
que essa alíquota deve incidir sobre a renda total, o que inclui dividendos,
auxílios, reembolsos, restituições, bônus, prêmios de seguro, entre outras
fontes atualmente isentas daqueles com renda superior a R$ 50 mil por mês.
“A proposta que eu faço difere
do PL, porque considera a renda total do contribuinte e não teria essas
exclusões de auxílios, reembolsos, benefícios salariais indiretos, que seriam
considerados na base de cálculo”, diz Carvalho.
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Relator amplia redução parcial de IR para quem ganha até R$ 7.350
Contribuições previdenciárias
De acordo com o estudo, uma
das inovações da proposta do Ipea é também incorporar as contribuições
previdenciárias (CPs) oficiais na tributação global da renda.
“Esse valor de alíquota de
14% seria maior que 10% porque eu considerei não só o imposto de renda na
carga tributária salarial, da renda, mas também eu considerei a contribuição
previdenciária, que tem um impacto muito alto em quem ganha pouco. Ela tem um
teto previdenciário de R$ 8 mil, então, quem ganha R$ 8 mil paga o mesmo
de contribuição previdenciária do que quem ganha mais do que isso”, defende.
A carta de conjuntura enfatiza
que a previdência brasileira “enfrenta um déficit significativo que deve ser
financiando por meio de outras receitas federais, de modo que as contribuições
previdenciárias acabam tendo natureza tributária, pois são apenas parcialmente
correlacionadas com o valor dos benefícios pagos no futuro. Consequentemente,
deixar de considerar as CPs que estão sujeitas a um teto e, portanto, impactam
mais os contribuintes mais pobres, é ignorar um fator crucial que contribui
para a regressividade da tributação da renda”, diz o texto.
Impactos nos cofres públicos
Com essa cobrança de 14%,
segundo a Carta de Conjuntura, seria possível gerar até R$ 145,6 bilhões aos
cofres públicos, correspondendo a um aumento de cerca de 40% na arrecadação do
Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) de 2024.
A medida aumentaria a atual
arrecadação do IRPF de 3,1% para 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB)
brasileiro, chegando a um nível similar ao de países como a Polônia, Eslováquia
e Uruguai. Ainda assim, ficaria abaixo da média de 8,5% dos países de economias
avançadas da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Limitações do projeto de lei
O Ipea aponta ainda, no
estudo, problemas das possíveis mudanças na tributação que o projeto de lei
apresentado pelo governo não soluciona.
“Os mais ricos não vão pagar
mais que os mais pobres e tampouco ele [imposto] vai ser proporcional. Os mais
ricos vão continuar pagando menos que a classe média. A proposta só vai
atenuar essa discrepância. Atualmente, os mais ricos pagam quase nada. É muito
pouco. Eles vão pagar 10%, mas a classe média em geral, em média, já paga 14%.
Por isso que eu proponho 14%”, defende o pesquisador.
De acordo com o estudo, a
tributação dos mais ricos vai requerer atenção a três pontos:
um possível incentivo à
mudança de domicílio fiscal dos mais ricos;
uma possível supertributação
do lucro global da pessoa jurídica (PJ);
e a regressividade horizontal
e vertical causada pelas atuais regras de tributação dos fundos de pensão, dos
aluguéis e das deduções para despesas médicas.
Sobre a mudança de domicílio
fiscal, a preocupação é que a taxação faça com que os mais ricos migrem as
riquezas para países que oferecem incentivo para a residência de milionários. O
Ipea propõe, então, uma tributação de saída do ganho de capital ainda não
realizado em 25% ou de uma tributação do patrimônio de 3%.
Esse tipo de imposto é cobrado
por países da OCDE como Alemanha, Austrália, Áustria, Canadá, Coreia do Sul,
Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, França, Israel, Japão, Noruega, Polônia e
Suécia. No caso dos Estados Unidos, contribuintes que alteram sua
cidadania estão sujeitos a uma alíquota de 23,8% sobre os ganhos de capital
ainda não realizados.
Em relação à tributação
de PJs, o estudo diz que "a parcela mais abastada da população
tem explorado brechas na legislação e redirecionado sua fonte de renda na forma
de rendimentos isentos”.
Para isso, o estudo defende
uma tributação mínima aos mais ricos, o que foi defendido pelo Brasil na presidência do G20.
“Esta é, de fato, a proposta defendida por este estudo para tributar
efetivamente a renda da pessoa física e garantir certa proporcionalidade na
tributação no topo da distribuição”, diz o autor.
Despesas médicas
Outro ponto destacado é
estabelecer um limite para deduções de despesas médicas que, de acordo com a
Carta de Conjuntura, representaram um gasto tributário de R$ 26,7 bilhões em
2024.
Como não há limite de valor,
elas beneficiam quem tem renda mais alta: segundo a base de declarações do
IRPF de 2022, os 5% de contribuintes mais ricos (renda mensal superior a R$
28.296) concentraram 22,4% das deduções para despesas médicas.
A solução apontada por
Carvalho seria combinar um crédito tributário fixo e igualitário, ou baseado na
idade, para todos os contribuintes e seus dependentes, com deduções limitadas
das despesas médicas.
Essa regra
também possibiliaria deduzir os gastos com medicamentos. De acordo
com o pesquisador, isso beneficiaria “enormemente os usuários do Sistema Único
de Saúde (SUS) que, apesar de contarem com serviços médicos gratuitos,
precisam, às vezes, comprar medicamentos que não são fornecidos gratuitamente”,
diz.
Agência Brasil

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