Conforme o levantamento do
Ministério da Saúde, o número de atendimentos por transtornos de ansiedade em
crianças de 10 a 14 anos cresceu 2.500% nos últimos dez anos, saltando de 1.850
registros em 2014 para mais de 24.300 casos em 2024. Entre adolescentes de 15 a
19 anos, o avanço foi ainda mais alarmante: +3.300% no mesmo período, com mais
de 53 mil atendimentos anuais registrados no Sistema Único de Saúde (SUS).
O fenômeno não é exclusivo do
Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, a taxa de ansiedade em crianças subiu
de 7,1% para 10,6% entre 2016 e 2022. A depressão infantil também aumentou de
3,2% para 4,6% no mesmo período. Especialistas apontam as redes sociais como um
dos principais gatilhos para a saúde mental de crianças e pré-adolescentes em
todo o mundo.
Segundo a psicóloga Taciana
Chiquetti, o aumento nos casos de depressão e ansiedade entre os menores tem a
ver, de forma mais ampla, com o modo de viver da sociedade contemporânea.
“Trata-se de uma crise bem anterior à pandemia, porém ainda mais perceptível a
partir dela e do que veio depois”, diz. São apontados fatores determinantes
como o isolamento social, o uso excessivo de telas, a hiperexposição às redes
sociais, e a pressão escolar.
“É comum o sentimento de não
pertencimento e de desconexão, características básicas de relações fragilizadas
na sociedade moderna ocidental e que influenciam diretamente na qualidade dos
sujeitos que estamos formando”, diz a psicóloga. Esse modo de funcionar
satisfazendo gostos e desejos de forma imperativa, diz ela, promove
inconsistência e interfere nas dimensões estruturais do ser humano.
Para Taciana, os educadores,
sejam eles pais ou professores, têm de modo geral dificuldade para estabelecer
os limites tão necessários às crianças e adolescentes, assim como também
demonstram dificuldade de manifestar afetos verdadeiros. “As comparações constantes
com realidades aleatórias às suas próprias também contribuem para manifestações
de sintomas relacionados à ansiedade e à depressão”, afirma.
Sinais
Os transtornos depressivos ou
ansiosos em uma criança possuem sinais diversos, segundo a psicóloga, como
dificuldade de relacionamento, evitação do ambiente escolar, dificuldades de
aprendizado, comportamento agressivo ou apático, dificuldades de se autorregular
em relação à alimentação, ao sono e ao controle das necessidades fisiológicas,
apego demasiado com os pais ou pessoas de referência, e choro constante.
Fatos normalmente cotidianos,
como o ambiente escolar, as redes sociais e o uso de tecnologias populares, são
capazes de adoecer mentalmente as crianças de acordo com o contexto em que se
desenrolam. “São coisas que podem reforçar o sentimento de não pertencimento,
de comparação, de desconexão, e de baixa autoestima”, diz.
O distanciamento e isolamento
fazem com que os pequenos tenham mais dificuldades em adquirir habilidades
fundamentais a uma formação saudável. “Algo que envolve experimentarem a vida
em todas as suas nuances, e aprenderem a fazer as coisas de modo autônomo e de
acordo com suas particularidades como indivíduos”, analisa.
Segundo ela, as escolas estão
buscando se capacitar e ampliar o modo de ver a educação emocional e a formação
humana. “A presença de psicólogos no ambiente escolar é também fundamental para
mudar esta realidade descrita pelas estatísticas do Ministério da Saúde”, diz.
A psicóloga ressalta que os sinais variam de acordo com as particularidades de
cada criança, e que devem ser analisados de modo mais amplo junto aos pais,
escola e profissionais de saúde mental.
Habilidades emocionais
O papel dos pais e
responsáveis diante de quadros de adoecimento emocional infantil é delicado e
fundamental. Envolve, segundo Taciana, ajudar as crianças a desenvolverem
habilidades emocionais e lidar com as frustrações. “Quanto mais amada a criança
se sente, mais ela respeita regras e desenvolve amor próprio e pelos outros. É
importante conhecer os princípios do comportamento. Busque compreender por que
razão a criança se comporta de determinada maneira”, diz.
Conhecer o processo de
desenvolvimento de uma criança é importante, mas é igualmente valioso para o
adulto, se autoconhecer como pai ou mãe. As crianças se espelham nos adultos,
então é preciso compreender o ambiente familiar para compreender a criança. “Não
se pode exigir de alguém em formação o que nem mesmo os adultos são ainda
capazes de fazer. A boa educação deve incluir, de forma equilibrada, limites e
regras, afeto e envolvimento”, afirma.
Comunicar-se de forma positiva
e clara com o filho é fundamental para que ele compreenda a mensagem que está
sendo passada. “As regras devem ser sempre claras, consistentes, realistas e
apropriadas à idade da criança. E devem ser repetidas, principalmente se a
criança é pequena. Por isso, tenha paciência. É importante evitar ameaças,
comparações, ignorá-la ou não dar explicações”, ensina. É importante criar um
ambiente familiar carinhoso no qual a criança se sinta aceita, orientada e
apoiada.
A psicóloga lamenta que muitos
pais ainda tenham resistência em procurar ajuda psicológica para seus filhos.
“O medo, emoção básica por trás da ansiedade, e a tristeza, emoção básica por
trás da depressão, são naturais e necessárias à vida. É a forma como essas
emoções são reguladas internamente, em nossa subjetividade, que determina se
ela nos protegerá dos riscos iminentes ou nos bloqueará de avançarmos na vida”,
explica.
Cada uma dessas emoções tem
formas diferentes de enfrentamento e um bom processo terapêutico pode ajudar,
ressalta Taciana. “É importante começar logo um processo terapêutico com a
criança quando os pais ou a escola identificam que algo não vai bem. Frequentemente
a psicoterapia com crianças e adolescentes é fluida e demonstra ótimos
resultados”, diz.
Segundo a psicóloga, há dez
habilidades emocionais que as crianças precisam desenvolver: autoconfiança,
coragem, paciência, persistência, tolerância, controle dos impulsos,
resistência às frustrações, comunicação, e empatia.
Tádzio França/Repórter
Tribuna do Norte

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