A partir dessa terça-feira (27), pequenos e grandes investidores vão
poder financiar a produção de alimentos orgânicos e
da agricultura familiar de sete cooperativas do Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
É a primeira vez que o MST
faz uma oferta pública no mercado de capitais, aberta a qualquer tipo de
investidor.
Mas não é a sua estreia no mercado
financeiro. Em maio de 2020, o grupo fez uma
oferta restrita, ou seja, voltada apenas para investidores qualificados,
que possuem patrimônio investido igual ou acima de R$ 1 milhão.
Na ocasião, o movimento emitiu um Certificado de
Recebíveis do Agronegócio (CRA) no valor de R$ 1,5 milhão para uma de suas
cooperativas (saiba mais no final da reportagem). O CRA é uma modalidade de
títulos de renda fixa que financia a produção no campo.
Dessa vez, o MST emitirá esse mesmo tipo de papel,
mas no valor de R$ 17,5 milhões, para financiar produção
de alimentos como arroz, feijão, milho, laticínios, entre outros.
DE ONDE VEM: MST tem
a maior produção de arroz orgânico da América Latina
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Financeira
Qualquer pessoa poderá comprar os títulos a partir
de R$ 100. O investimento tem uma remuneração pré-fixada de 5,5% ao ano, que será paga com o
lucro da produção das sete cooperativas do MST (saiba
mais sobre elas abaixo).
O CRA do MST tem um prazo de 5 anos, o
que significa que é só depois desse período que o investidor terá o resgate do
dinheiro aplicado. Além disso, tem isenção de Imposto de
Renda.
Os interessados devem reservar os títulos a partir
desta terça na Terra Investimentos, única corretora em que
eles estarão disponíveis. A securitizadora responsável pela emissão dos
papeis é a Gaia Agro.
Neste primeiro momento, que vai de 27 de julho até 12 de agosto, ocorrerá somente a reserva dos
títulos. E a efetivação da compra será no dia 18 de agosto,
seguindo um cronograma normal das ofertas públicas.
Depois dessas etapas, será possível saber o valor
que as sete cooperativas conseguiram levantar.
O MST não pode falar com o G1 porque está em período
de silêncio, o que é regra durante qualquer operação do tipo. O movimento só
poderá se manifestar após a conclusão do processo.
As informações dessa reportagem foram retiradas do
prospecto preliminar da oferta pública.
Conheça a seguir as sete cooperativas:
Cooperativa
de Comercialização e Reforma Agrária Avante (Coana)
Estado:
Paraná
Famílias:
231 ativas e cerca de 1 mil envolvidas nas brigadas em assentamentos na região
Produtos:
leite, queijos, manteiga, requeijão, arroz, feijão, entre outros.
Cooperativa
de Produção, Industrialização e Comercialização Agropecuária dos Assentados e
Agricultores Familiares da Região Nordeste do Estado de São Paulo (Coapar)
Estado: São
Paulo
Famílias: 455
Produtos: leite,
achocolatados, queijos, iogurtes, requeijão, hortifruti, feijão carioquinha,
entre outros.
Cooperativa
Agroindustrial Ceres (Coopaceres)
Estado:
Mato Grosso do Sul
Famílias: 39
Produtos: sementes
não transgênicas de soja, milho, arroz, entre outras. Todas são certificadas
pelo Ministério da Agricultura e Fundação Prosementes.
Cooperativa
Regional de Comercialização do Extremo Oeste (Cooperoeste)
Estado: Santa
Catarina
Famílias: 1.700
Produtos: laticínios
Cooperativa
dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre Ltda (Cootap)
Estado:
Rio Grande do Sul
Famílias:
609
Produtos:
arroz, sucos, geleias, entre outros.
Cooperativa
Agroindustrial de Produção e Comercialização Conquista (Copacon)
Estado: Paraná
Famílias: 350
Produtos: laticínios,
arroz, feijão, milho, soja, hortaliças, frutas, sucos, geleias, entre outros
Cooperativa
de Produção Agropecuária Vitória (Copavi)
Estado:
Paraná
Famílias: 138
Produtos:
açúcar mascavo, cachaça, melado de cana, entre outros.
Movimentos sociais no mercado
financeiro
A entrada do MST no mercado financeiro foi
idealizada pelo economista e CEO da Insight Trading Consultoria, Eduardo
Moreira. Ele foi um dos fundadores do banco Brasil Plural e ex-sócio do Banco
Pactual (hoje BTG Pactual).
Sua trajetória tem algumas curiosidades, como ter
sido condecorado em 2012 pela rainha da Elisabeth II por seu esforço em eliminar a violência no treinamento de cavalos.
"No ano passado,
o MST estava buscando financiamento em bancos para poder concluir a construção
de uma agroindústria de arroz orgânico e carne suína. Eles me pediram
orientação de qual banco ir, mas eu sugeri que eu e meus amigos financiássemos
a operação", conta Moreira.
"Era uma forma de colocar dinheiro em algo que
eu acredito", ressalta.
Foi então estruturado um CRA que captou R$ 1,5
milhão para a Cooperativa de Produção Agropecuária Nova Santa Rita (Coopan), no
Rio Grande do Sul. A associação tem 29 famílias fundadoras e 80 associados que
produzem, além de arroz orgânico e carne de porco, leite e pães para consumo
interno.
A partir dessa operação, surgiu a ideia de expandir
iniciativas semelhantes, o que deu origem, ainda em 2020, ao Programa de
Financiamento Popular da Agricultura Familiar para Produção de Alimentos
Saudáveis, o Finapop.
O movimento tem o objetivo de
impulsionar captações de recursos para a produção da agricultura familiar e
orgânica e está, inclusive, apoiando a oferta pública que se inicia
nesta terça.
"Não é um fundo e nem um banco. É um
movimento", destaca Moreira, explicando que, por meio dessa rede, é
possível encontrar informações sobre iniciativas que estejam precisando de
financiamento. "Já temos 8 mil pessoas inscritas no site", diz.
Em meados de 2020, o Finapop planejava estruturar
um outro CRA para financiar a produção de mel, café, pimenta, mandioca e soja
de cinco cooperativas do MST. Mas as organizações conseguiram fechar contratos
diretos com investidores.
Moreira comenta que não há nenhuma contradição
nessas operações.
"O sistema financeiro não é algo do
capitalismo, qualquer país tem um. Em Cuba, tem banco, na China, na Venezuela,
na Coreia do Norte, nos EUA, Alemanha. O que é diferente entre os países é a
forma como o sistema financeiro se estrutura e como as pessoas podem
acessá-lo", diz.
"Em tese, o sistema financeiro deveria fazer com que os recursos que estão em excesso pudessem chegar a mais mãos, daqueles precisam de recursos para exercer as suas atividades", conclui.
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