Geraldo Alckmin, presidente em exercício, vetou parcialmente projeto que visa modernizar o marco regulatório do setor elétrico | Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom
O presidente em exercício,
Geraldo Alckmin, vetou parcialmente o Projeto de Lei de Conversão nº 10, de
2025, que teve origem na Medida Provisória nº 1304, de 11 de julho de 2025, que
visa modernizar o marco regulatório do setor elétrico, segundo publicação desta
terça-feira (25) do Diário Oficial da União (DOU). Um dos vetos que causaram
preocupação no setor foi o que trata do pagamento pelos cortes de geração, o
chamado “curtailment”.
A Frente Nacional dos Consumidores de Energia Elétrica havia enviado uma carta aberta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendendo oito vetos na MP aprovada pelo Congresso neste mês. Segundo a entidade, sem os vetos, os custos para os consumidores subiriam gradualmente até atingir R$ 15 bilhões, o que significaria um aumento de 6% na conta de luz. A Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEeólica) contesta essa conta.
Para a presidente da entidade,
Elbia Gannoum, da forma como foi sancionado o projeto prejudica a indústria de
energias renováveis em todo o país, colocando em risco projetos já em operação
e investimentos futuros. “Não é risco, é incerteza absoluta no futuro, e isso
vai prejudicar muito os investimentos futuros. Prejudica o sinal de
investimento futuro e coloca em risco os projetos em operação no presente”,
afirma a representantes da entidade.
Um dos pontos mais criticados
pelo setor de renováveis é o que trata dos cortes de geração. Também foi vetado
o dispositivo que previa o ressarcimento, via encargos, de todos os eventos de
redução da produção de energia elétrica que tenham sido originados externamente
às instalações dos respectivos empreendimentos de geração, o chamado
curtailment.
“Nós precisamos de um
direcionamento para os cortes de geração, para contratos que já foram feitos no
passado, vendidos no ACR (Ambiente de Contratação Regulada). Mais de 70% dos
nossos projetos foram vendidos no ACR, então nós vendemos, temos que entregar,
mas eles estão sujeitos a cortes. Então os projetos em operação estão em risco,
porque eles não vão obter a receita esperada com essas vendas que já foram
assinadas, vendidas, tanto no mercado livre quanto no mercado regular”,
explicou a presidente da Abeeólica.
Elbia Gannoum sobre vetos do
governo: “Isso vai prejudicar muito os investimentos futuros” | Foto: Alex
Régis
“Para nós, o futuro ficou
bastante incerto e o passado incompleto, porque o tratamento dado ali não
resolve a classificação dos cortes e não resolve todo o corte do passado, ele
não resolve 100% do corte de rede como nós esperávamos”, acrescenta.
Conforme antecipado na
segunda-feira pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, no programa
Roda Viva, entre os trechos derrubados estão a mudança de regras no cálculo do
preço de referência do petróleo, com o objetivo de aumentar a arrecadação da
União.
Na justificativa, o
vice-presidente afirmou que o trecho “gera insegurança jurídica e risco de
judicialização, bem como compromete investimentos de longo prazo em curso no
setor de óleo e gás”.
Segundo o Planalto, a medida
“ampliaria o escopo de compensações e transferiria aos consumidores os custos
desses ressarcimentos”. “Adicionalmente, ao impor ressarcimentos retroativos a
todos os eventos que deram causa aos cortes de geração, a medida elevaria, de
forma significativa, as tarifas, afetando a modicidade tarifária”, diz a
justificativa. O estímulo à sobreoferta de energia também foi citado como
causa.
Alckmin vetou também o trecho
que restringia novos arranjos de autoprodução a novas usinas de geração de
energia. Na justificativa, disse que a medida poderia gerar “ineficiência no
sistema elétrico nacional, impedindo o uso de capacidade já instalada, com
preços mais baixos, para viabilizar projetos intensivos no consumo de energia”.
Com isso, poderia aumentar os custos para a cadeia produtiva nacional e os
preços dos produtos à população.
Também foi vetada a utilização
da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo setorial que financia
políticas públicas e subsídios ligados ao setor elétrico e que é custeada pelo
consumidor via conta de luz, para distribuição de equipamentos de recepção de
sinal de televisão aberta.
O governo federal também vetou
a obrigatoriedade das comercializadoras de eletricidade de destinarem, todo
ano, no mínimo, 0,50% de sua receita operacional líquida a pesquisa e
desenvolvimento do setor elétrico e, no mínimo, 0,50% em programas de eficiência
energética no uso final.
“O dispositivo contraria o
interesse público ao impor às comercializadoras a obrigatoriedade de aplicar
porcentuais mínimos de sua receita operacional líquida em pesquisa,
desenvolvimento e eficiência energética, sem considerar o modelo de negócio
dessas empresas”, afirmou o vice-presidente na justificativa.
Contratação de reserva de
capacidade
O presidente em exercício
vetou ainda o trecho que obrigava a necessidade de contratação anual de reserva
de capacidade com a indicação da localização das usinas a serem contratadas.
Segundo o governo, a medida
contraria o interesse público, já que a realização de certames deve “considerar
a oferta disponível e a possibilidade de ganhos de eficiência decorrentes do
agrupamento de demandas estabelecer a periodicidade para apuração”.
Em relação à indicação de
locais para as usinas a serem contratadas, cita que a medida “pode conduzir a
contratações ineficientes e gerar impactos tarifários”.
Foi vetado ainda o aval para
utilização do superávit financeiro do Fundo Social como fonte de recursos para
linhas de financiamento reembolsável para investimentos em infraestrutura
estratégica no setor de gás natural.
Para o governo Lula, ao alocar
recursos em operações de crédito direcionadas a agentes privados, o dispositivo
descaracteriza as finalidades originalmente atribuídas ao Fundo Social.
Foi cortado ainda o trecho que
impunha um prazo de 90 dias para análise de licenciamento ambiental especial de
usinas hidrelétricas. Na justificativa, afirmou-se que a iniciativa contraria o
interesse público ao impor “prazo exíguo e rígido” desconsiderando impactos
socioambientais expressivos e que requerem avaliação técnica aprofundada no
caso desse tipo de empreendimento.
VETOS
Confira os principais trechos
retirados pelo governo
Curtailment: Foi rejeitada
regra de compensação pelas perdas com cortes de energia. No entanto, o veto
manteve a garantia de que as empresas produtoras serão pagas se tiverem que
cortar a produção por problemas técnicos na rede.
Leilão de baterias: Foi vetada
a regra que forçava apenas quem produz energia a pagar pelos grandes sistemas
de armazenamento.
Regras de concorrência: Foi
retirado o trecho que tornava obrigatório que os processos de concorrência do
setor elétrico seguissem estritamente as diretrizes do planejamento do setor.
Divisão de Prejuízo: O governo
rejeitou um mecanismo que forçaria os produtores de energia a dividir entre si
parte dos custos de quando há cortes de energia. O tema foi adiado para ser
discutido depois, incluindo as regras de micro e minigeração distribuída.
Taxas para o comércio de
energia: Foi barrada a obrigação das empresas que comercializam energia (mas
não a produzem) de pagar por pesquisa e eficiência energética.
Micro e minigeração
distribuída: Foi vetada a inclusão de novos custos da micro e minigeração
distribuída (estimados em R$ 5 bilhões) na Conta de Desenvolvimento Energético
(CDE).
Leilões isolados: Veto mantém
que a realização de leilões para locais que não estão conectados à rede
principal de energia seja definida pelo planejamento do setor. Também evitou
uma regra específica que atribuía responsabilidade à distribuidora do Amazonas.
Migração de grandes geradoras:
Veto impede que usinas de energia que já operam no mercado livre migrem para o
sistema de geração distribuída (onde as regras são diferentes).
Punição para servidores: Foi
vetada a regra que tornaria a omissão ou a falta de contratação de serviços
essenciais de energia um ato de improbidade administrativa para o servidor
público.
Custo da TV na conta de luz:
Foi rejeitada a regra que permitiria a utilização de recursos do programa Luz
para Todos para equipamentos de recepção de sinal de televisão aberta (“banda
Ku”).
Linha de Transmissão RO-AM:
Foi retirada a obrigação de licitar de forma imediata o sistema de transmissão
que ligaria Porto Velho (RO) a Manaus (AM). O veto mantém que o planejamento do
setor defina as melhores alternativas para essa ligação.
Leilões anuais: Foi vetada a
regra que obrigava a realização de leilões de potência para garantir energia
extra todos os anos. Agora, o governo decide quando fazer esses leilões.
Preço do petróleo: Foi vetada
uma regra que revisava o preço de referência do barril de petróleo usado no
cálculo dos royalties. O governo justificou o veto afirmando que a redefinição
da base de cálculo geraria “insegurança jurídica e risco de judicialização, bem
como comprometeria investimentos de longo prazo em curso no setor de óleo e
gás”.
Penalidades para agentes
públicos
Alckmin vetou no projeto o
trecho que alterava parte da Lei de Improbidade Administrativa, que pune
condutas ilegais de servidores públicos. O texto aprovado pelo Congresso
Nacional adicionava penalidades àquele que “omitir-se, dolosamente e sem justa
causa, na apuração ou na realização das contratações de empreendimentos ou
serviços legalmente exigidos para garantir a segurança energética e a
continuidade do fornecimento de energia elétrica”.
Na justificativa ao veto, o
vice-presidente afirmou que o trecho “contraria o interesse público ao ampliar
o rol taxativo da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992 (Lei de Improbidade
Administrativa) para incluir conduta setorial específica relacionada a contratações
no âmbito da segurança energética”. Disse também que a iniciativa traria
“insegurança jurídica na atuação dos agentes públicos, podendo comprometê-la”.
A autoria do trecho era do
relator da MP, Eduardo Braga (MDB-AM), que disse que tinha como alvo principal
funcionários do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), órgão de direito
privado que presta serviço ao setor público e é responsável pela operação do
Sistema Interligado Nacional (SIN).
O governo também vetou o
trecho que permitia que usinas de geração de eletricidade pudessem solicitar, a
qualquer momento, enquadramento na categoria de microgeração ou minigeração
distribuída (MMGD) mediante algumas condições.
Segundo o governo federal, a
iniciativa “altera o modelo regulatório e cria tratamento diferenciado a
agentes que não foram concebidos para operar nesse regime, o que compromete a
coerência normativa majorando o preço da energia”.
Ainda em relação à GD, o
vice-presidente vetou o dispositivo que incluía entre os objetivos da Conta de
Desenvolvimento Energético (CDE) a compensação de benefícios tarifários
associados ao segmento.
Para o Planalto, o trecho
aumentaria o “risco de ampliação dos encargos setoriais e, portanto, de impacto
tarifário”.

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