quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Governo veta pagamentos por cortes de geração em MP do setor elétrico

Geraldo Alckmin, presidente em exercício, vetou parcialmente projeto que visa modernizar o marco regulatório do setor elétrico | Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom

O presidente em exercício, Geraldo Alckmin, vetou parcialmente o Projeto de Lei de Conversão nº 10, de 2025, que teve origem na Medida Provisória nº 1304, de 11 de julho de 2025, que visa modernizar o marco regulatório do setor elétrico, segundo publicação desta terça-feira (25) do Diário Oficial da União (DOU). Um dos vetos que causaram preocupação no setor foi o que trata do pagamento pelos cortes de geração, o chamado “curtailment”.

A Frente Nacional dos Consumidores de Energia Elétrica havia enviado uma carta aberta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendendo oito vetos na MP aprovada pelo Congresso neste mês. Segundo a entidade, sem os vetos, os custos para os consumidores subiriam gradualmente até atingir R$ 15 bilhões, o que significaria um aumento de 6% na conta de luz. A Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEeólica) contesta essa conta.

Para a presidente da entidade, Elbia Gannoum, da forma como foi sancionado o projeto prejudica a indústria de energias renováveis em todo o país, colocando em risco projetos já em operação e investimentos futuros. “Não é risco, é incerteza absoluta no futuro, e isso vai prejudicar muito os investimentos futuros. Prejudica o sinal de investimento futuro e coloca em risco os projetos em operação no presente”, afirma a representantes da entidade.

Um dos pontos mais criticados pelo setor de renováveis é o que trata dos cortes de geração. Também foi vetado o dispositivo que previa o ressarcimento, via encargos, de todos os eventos de redução da produção de energia elétrica que tenham sido originados externamente às instalações dos respectivos empreendimentos de geração, o chamado curtailment.

“Nós precisamos de um direcionamento para os cortes de geração, para contratos que já foram feitos no passado, vendidos no ACR (Ambiente de Contratação Regulada). Mais de 70% dos nossos projetos foram vendidos no ACR, então nós vendemos, temos que entregar, mas eles estão sujeitos a cortes. Então os projetos em operação estão em risco, porque eles não vão obter a receita esperada com essas vendas que já foram assinadas, vendidas, tanto no mercado livre quanto no mercado regular”, explicou a presidente da Abeeólica.

Mulher com camiseta azul

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Elbia Gannoum sobre vetos do governo: “Isso vai prejudicar muito os investimentos futuros” | Foto: Alex Régis

“Para nós, o futuro ficou bastante incerto e o passado incompleto, porque o tratamento dado ali não resolve a classificação dos cortes e não resolve todo o corte do passado, ele não resolve 100% do corte de rede como nós esperávamos”, acrescenta.

Conforme antecipado na segunda-feira pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, no programa Roda Viva, entre os trechos derrubados estão a mudança de regras no cálculo do preço de referência do petróleo, com o objetivo de aumentar a arrecadação da União.

Na justificativa, o vice-presidente afirmou que o trecho “gera insegurança jurídica e risco de judicialização, bem como compromete investimentos de longo prazo em curso no setor de óleo e gás”.

Segundo o Planalto, a medida “ampliaria o escopo de compensações e transferiria aos consumidores os custos desses ressarcimentos”. “Adicionalmente, ao impor ressarcimentos retroativos a todos os eventos que deram causa aos cortes de geração, a medida elevaria, de forma significativa, as tarifas, afetando a modicidade tarifária”, diz a justificativa. O estímulo à sobreoferta de energia também foi citado como causa.

Alckmin vetou também o trecho que restringia novos arranjos de autoprodução a novas usinas de geração de energia. Na justificativa, disse que a medida poderia gerar “ineficiência no sistema elétrico nacional, impedindo o uso de capacidade já instalada, com preços mais baixos, para viabilizar projetos intensivos no consumo de energia”. Com isso, poderia aumentar os custos para a cadeia produtiva nacional e os preços dos produtos à população.

Também foi vetada a utilização da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo setorial que financia políticas públicas e subsídios ligados ao setor elétrico e que é custeada pelo consumidor via conta de luz, para distribuição de equipamentos de recepção de sinal de televisão aberta.

O governo federal também vetou a obrigatoriedade das comercializadoras de eletricidade de destinarem, todo ano, no mínimo, 0,50% de sua receita operacional líquida a pesquisa e desenvolvimento do setor elétrico e, no mínimo, 0,50% em programas de eficiência energética no uso final.

“O dispositivo contraria o interesse público ao impor às comercializadoras a obrigatoriedade de aplicar porcentuais mínimos de sua receita operacional líquida em pesquisa, desenvolvimento e eficiência energética, sem considerar o modelo de negócio dessas empresas”, afirmou o vice-presidente na justificativa.

Contratação de reserva de capacidade

O presidente em exercício vetou ainda o trecho que obrigava a necessidade de contratação anual de reserva de capacidade com a indicação da localização das usinas a serem contratadas.

Segundo o governo, a medida contraria o interesse público, já que a realização de certames deve “considerar a oferta disponível e a possibilidade de ganhos de eficiência decorrentes do agrupamento de demandas estabelecer a periodicidade para apuração”.

Em relação à indicação de locais para as usinas a serem contratadas, cita que a medida “pode conduzir a contratações ineficientes e gerar impactos tarifários”.

Foi vetado ainda o aval para utilização do superávit financeiro do Fundo Social como fonte de recursos para linhas de financiamento reembolsável para investimentos em infraestrutura estratégica no setor de gás natural.

Para o governo Lula, ao alocar recursos em operações de crédito direcionadas a agentes privados, o dispositivo descaracteriza as finalidades originalmente atribuídas ao Fundo Social.

Foi cortado ainda o trecho que impunha um prazo de 90 dias para análise de licenciamento ambiental especial de usinas hidrelétricas. Na justificativa, afirmou-se que a iniciativa contraria o interesse público ao impor “prazo exíguo e rígido” desconsiderando impactos socioambientais expressivos e que requerem avaliação técnica aprofundada no caso desse tipo de empreendimento.

VETOS

Confira os principais trechos retirados pelo governo

Curtailment: Foi rejeitada regra de compensação pelas perdas com cortes de energia. No entanto, o veto manteve a garantia de que as empresas produtoras serão pagas se tiverem que cortar a produção por problemas técnicos na rede.

Leilão de baterias: Foi vetada a regra que forçava apenas quem produz energia a pagar pelos grandes sistemas de armazenamento.

Regras de concorrência: Foi retirado o trecho que tornava obrigatório que os processos de concorrência do setor elétrico seguissem estritamente as diretrizes do planejamento do setor.

Divisão de Prejuízo: O governo rejeitou um mecanismo que forçaria os produtores de energia a dividir entre si parte dos custos de quando há cortes de energia. O tema foi adiado para ser discutido depois, incluindo as regras de micro e minigeração distribuída.

Taxas para o comércio de energia: Foi barrada a obrigação das empresas que comercializam energia (mas não a produzem) de pagar por pesquisa e eficiência energética.

Micro e minigeração distribuída: Foi vetada a inclusão de novos custos da micro e minigeração distribuída (estimados em R$ 5 bilhões) na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).

Leilões isolados: Veto mantém que a realização de leilões para locais que não estão conectados à rede principal de energia seja definida pelo planejamento do setor. Também evitou uma regra específica que atribuía responsabilidade à distribuidora do Amazonas.

Migração de grandes geradoras: Veto impede que usinas de energia que já operam no mercado livre migrem para o sistema de geração distribuída (onde as regras são diferentes).

Punição para servidores: Foi vetada a regra que tornaria a omissão ou a falta de contratação de serviços essenciais de energia um ato de improbidade administrativa para o servidor público.

Custo da TV na conta de luz: Foi rejeitada a regra que permitiria a utilização de recursos do programa Luz para Todos para equipamentos de recepção de sinal de televisão aberta (“banda Ku”).

Linha de Transmissão RO-AM: Foi retirada a obrigação de licitar de forma imediata o sistema de transmissão que ligaria Porto Velho (RO) a Manaus (AM). O veto mantém que o planejamento do setor defina as melhores alternativas para essa ligação.

Leilões anuais: Foi vetada a regra que obrigava a realização de leilões de potência para garantir energia extra todos os anos. Agora, o governo decide quando fazer esses leilões.

Preço do petróleo: Foi vetada uma regra que revisava o preço de referência do barril de petróleo usado no cálculo dos royalties. O governo justificou o veto afirmando que a redefinição da base de cálculo geraria “insegurança jurídica e risco de judicialização, bem como comprometeria investimentos de longo prazo em curso no setor de óleo e gás”.

Penalidades para agentes públicos

Alckmin vetou no projeto o trecho que alterava parte da Lei de Improbidade Administrativa, que pune condutas ilegais de servidores públicos. O texto aprovado pelo Congresso Nacional adicionava penalidades àquele que “omitir-se, dolosamente e sem justa causa, na apuração ou na realização das contratações de empreendimentos ou serviços legalmente exigidos para garantir a segurança energética e a continuidade do fornecimento de energia elétrica”.

Na justificativa ao veto, o vice-presidente afirmou que o trecho “contraria o interesse público ao ampliar o rol taxativo da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa) para incluir conduta setorial específica relacionada a contratações no âmbito da segurança energética”. Disse também que a iniciativa traria “insegurança jurídica na atuação dos agentes públicos, podendo comprometê-la”.

A autoria do trecho era do relator da MP, Eduardo Braga (MDB-AM), que disse que tinha como alvo principal funcionários do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), órgão de direito privado que presta serviço ao setor público e é responsável pela operação do Sistema Interligado Nacional (SIN).

O governo também vetou o trecho que permitia que usinas de geração de eletricidade pudessem solicitar, a qualquer momento, enquadramento na categoria de microgeração ou minigeração distribuída (MMGD) mediante algumas condições.

Segundo o governo federal, a iniciativa “altera o modelo regulatório e cria tratamento diferenciado a agentes que não foram concebidos para operar nesse regime, o que compromete a coerência normativa majorando o preço da energia”.

Ainda em relação à GD, o vice-presidente vetou o dispositivo que incluía entre os objetivos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) a compensação de benefícios tarifários associados ao segmento.

Para o Planalto, o trecho aumentaria o “risco de ampliação dos encargos setoriais e, portanto, de impacto tarifário”.

Tribuna do Norte

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